15.12.10

babaquice

as pessoas gostam do que eu escrevo. por que raios as pessoas gostam do que eu escrevo se eu nem escrevo bem e os assuntos são sempre os mesmos, super repetitivos? talvez as pessoas tenham mau gosto ou só estejam acostumadas a coisas que são totalmente diferentes das coisas que eu escrevo e isso torna as coisas que eu escrevo diferentes, inovadoras e interessantes. o que eu acho uma babaquice, porque as coisas que eu escrevo são bem idiotas. (e esse parágrafo está ridículo mas eu gostei dele porque achei babaca.)

eu deveria estar escrevendo mais. mas eu só tenho inspiração quando eu estou triste, e eu não tenho estado triste de verdade há um tempo. e eu acho que é mentira essa coisa de inspiração por mal-do-século - é coisa muito de romântico babaca que só escrevia livro chato - porque eu acho que inspiração baseada em sentimentos, pelo menos para texto em prosa, algo meio estranho.

o fato é: não tenho escrito porra nenhuma. e por porra nenhuma, leia, porra nenhuma. gosto de culpar a falta de tempo dizendo que eu estou trabalhando demais. e eu nem estou trabalhando tão demais assim, semestre que vem estarei trabalhando demais de verdade; se eu não escorregar, batera a cabeça e morrer no meio tempo. aí eu penso que eu estou sem inspiração porque eu estou feliz e é mais legal viver a vida do que criar histórias xis na minha cabeça num tempo que eu poderia estar vivendo a vida. o que é outra babaquice, visto que tenho meus momentos de ócio que eu poderia aproveitar para escrever. então eu percebo: eu não estou escrevendo porque estou com preguiça.

se eu adotasse resoluções de ano novo, eu provavelmente todo ano prometeria ter mais preguiça. e todo ano não cumpriria e acharia ridículo ter prometido ter menos preguiça. mas eu acho que vou voltar a escrever mais só para provar que eu não tiro inspiração só do mal-do-século.

é. assim o farei.

(puta texto tosco do caralho.)

27.10.10

terminal

estou doente. doença daquelas avassaladoras que chegam como um furacão e fodem com tudo pela frente. como eu fiquei doente? não faço a mínima ideia, um dia notei uma dor chata que não ia embora em meu ombro esquerdo. não é nada relacionado ao coração, artérias ou coisa do tipo. era mais um nódulo ou coisa assim. não doía muito, nunca doeu muito, na verdade. então vieram os enjoos. os mal estares. fui levando, precisava ganhar a vida, precisava ajudar aos que me importavam.

aguentei alguns anos, insônia, dores crônicas. médicos? médicos não, eles iam querer descobrir o que havia de errado e eu não tinha tempo. não tinha tempo para consultas, nem para exames, nem para toda a política de tentativa e erro que há em diagnósticos. depois viriam os prognósticos e eles não seriam nem um pouco amigáveis. talvez fossem, se considerasse uma amizade de férias.

como eu sei de tudo isso? porque alguma hora eu precisei ir a um para conseguir alguns remédios para as dores, não aguentava mais tanta dor. então veio a sabatina de exames. raio x. "você tem uma massa dura aí.". ressonância magnética. inconclusivo. tomografia. "acho que precisamos de uma biópsia.". e quando os resultados chegaram, "metástase.". alguns meses nesse processo, tomando os remédios que eu queria. ainda não sei porque não tentei com aspirina primeiro. jovem para um câncer com metástase, bem jovem. pelo menos vivi o suficiente enquanto pude. apesar de que eu ache que eu trabalharia um pouco menos se soubesse que ia ser assim rápido.

o irônico da situação é que nunca tive medo de morrer, ou da morte em si. sempre achei que algum dia aconteceria, mas que estava tão longe e tão fora de perigo que nunca achei que fosse realmente acontecer. sempre supus que morreria em um acidente súbito ou de velhice. me enganei. vai ser de uma doença que mostra que meu corpo é mais fodido que a mente de um louco, porque ele é tão louco que não consegue controlar as próprias células que se replicam.

agora tenho nódulos por todo o corpo, alguns doem, outros não. alguns coçam, outros deixam a pele irritadiça. os últimos são os mais irritantes, porque fica tudo tão sensível que o mais leve toque traz uma dor lacinante. não dá para explicar, só sentindo para saber como é. algumas pessoas olham para mim com pena. acho que é, de certa forma, um alivio para eles. esse tipo de situação sempre nos mostra que estamos vivos e o quanto a vida é imprevisível e que seria melhor se a vivêssemos da melhor forma que conviesse.

quimio. o tratamento é muito chato, tanto tédio enquanto tomo os remédios. e eles só me trazem mais enjoos. a parte boa de ficar doente assim é que as pessoas são sempre legais com você. afinal, é esperado que você morra a qualquer hora, ninguém quer ficar com o peso de ter tratado um pobre moribundo mal nos últimos dias de vida.

se teve algum efeito a quimio? tirando os enjoos aumentados, nenhum. nem o cabelo caiu, acho que fizeram errado. quando eu era criança, sempre imaginei quimioterapia como umas ondas invisíveis que iam atrás só das partes ruim e as matavam, me decepcionei, remédio na veia. pena, acho que uma câmara com ondas seria muito mais bonito para um tratamento.

como a família está levando? pelo que eu percebo ainda estão em negação, todos falando que eu vou ficar bem e isso e aquilo, mas dá para ver a esperança da cura se esvaindo nos olhos deles a cada vez que aparecem por aqui. é, não estou mais em casa, dizer que fiz amizade com os enfermeiros é clichet, então não o direi, tenho fugido de padrões desde que meu cabelo não caiu, virou quase uma missão de vida.

confesso que dá um pouco de medo ter consciência que vou morrer em breve. uma semana, duas. um mês, dois. você começa a pensar, sabe? pelo menos eu penso sem parar no que vai acontecer quando eu morrer. se tem céu ou inferno, se tem algo, se é a ausência de tudo, se todas as coisas que dizem que existem realmente estão lá. vieram alguns padres aqui falar comigo, ver se eu queria um ombro, orientação espiritual ou qualquer coisa assim - deixei eles falarem, vale à pena fazer a vontade dos outros quando você vai morrer, assim eles ficam felizes achando que me deixaram com menos medo. mas ainda assim prefiro descobrir por minha própria experiência o que existe, se é que existe algo, do lado de lá.

não acho que eu vá durar dois dias, vi o guia da tv, não tem nada legal passando e amanhã é reprise de hoje, a internet me entediou de duas semanas para cá. resolvi escrever para passar o tempo, espero que a minha criatividade seja suficiente até eu morrer.

tem muitas flores aqui, já falei para economizarem e mandarem flores só no velório, não me ouvem. o que eu posso fazer? sei que cansei da sabatina de exames, cansei dos médicos com seus olhares piedosos, cansei das pessoas que eu conheço se sentindo na obrigação de estarem aqui.

eu acho que eu vou dispensar a todos para terminnnnnnnnnnnn

25.8.10

f5

tá, né, vamos postar alguma coisa.

tô sem saco pra escrever. na verdade, agora também tô sem tempo. entonces, my bad. foi mal aí você que gosta de ler as histórias mal escritas que eu escrevo.

a vida tá boa, só pra sanar sua curiosidade. é justamente por isso que eu não tô escrevendo, tá sendo mais legal viver a vida do que ficar inventando história por aí. daqui a pouco aprendo a conciliar as coisas e fica tudo normal de novo.

além disso tô trabalhando bastante. terças e quintas começo às 14h e termino às 4h. sem contar tempo de correção de lição e tal. o pior é que ainda nem dá pra gritar a plenos pulmões um "sou rica!" retumbante e sonoro. pena. aliás, estou trabalhando agora e vou trabalhar mais um pouco em alguns poucos minutos.

fica aqui o pedido de desculpa ao leitor e digo que voltarei assim que eu aprender a conciliar a vida, o trabalho e a brinks de escrever.

no mais, estou aceitando sugestões para contos. me dê um tema, eu escrevo quando tiver tempo.

15.8.10

f5

preguiça descomunal de escrever.


e eu tô com sono e nem vou dormir. um viva à volta ao trabalho: viva.

27.7.10

16/03/08

hoje tive um dia horrível. não foi só hoje, foi hoje e ontem, mas para mim é só hoje porque ainda não dormi e se eu não dormi o dia não mudou. tudo bem, teve uma parte super legal, mas o saldo do dia é negativo. vou contar tudo do começo, porque, aff, foi ridículo. absolutamente ridículo, ridículo demais, mais ridículo que tropeçar e cair de cara no chão na frente da sala de aula.

domingo fiquei na casa da elisa a manhã e a tarde todas. em vez de ligar para o meu pai ou pedir carona para a mãe da elisa eu fui sozinha, de ônibus. queria pensar um tempo e seria útil o tempo no ônibus. aí cheguei em casa, abri a porta e me deparo com meu pai só de cueca no meio da sala. eu olhei para ele, ele olhou para mim e paralisou. ficou lá, com aquela cara de bobão, otário, cretino, filho da puta, infiel de merda que foi pego na mentira. se ele não tivesse feito a cara de "oops, fui pego!" eu teria ignorado o fato e ido para o meu quarto, sabe, ele estava sozinho em casa, nem esperava que eu chegasse, ele tinha direito de andar de cueca pela casa vazia. mas nããããão, para que saber mentir? tem que mostrar com o rosto que estava fazendo algo de errado e foi pego!

aí eu fiquei com raiva saí correndo pela casa pensando que ele já tinha arrumado uma puta ou algo assim. e se fosse uma puta eu nem teria ficado tão possessa, mas, não, nem para isso o idiota serve. quando eu abro a porta do quarto dele, está lá a clarice pelada na cama fumando um cigarro com cara de quem tinha feito algo muito prazeroso. comecei a gritar feito louca que ele era um estúpido, que mal tinha enterrado a mulher e já estava com outra na cama, que ele nem tinha esperado a cama esfriar pra colocar outra mulher dentro de casa, que já ia formar família de novo, que ele era um irresponsável, que se ele quisesse comer as putas dele que fizesse num motel, porque ele não respeitou nossa família nem a mamãe e mais um monte de coisas loucas que devem ter feito todo sentido na hora que eu gritei. até que chegou uma hora que eu cansei de gritar, entrei no meu quarto, peguei algumas coisas aleatórias e saí de casa.

quando eu já estava meio longe mandei uma mensagem pra elisa dizendo que não ia ficar em casa e depois eu explicaria. eu nem sabia para onde eu ia ou o que eu ia fazer, só sabia que eu estava muito puta com meu pai e não queria ver a cara dele por algum tempo. fiquei andando sem rumo pela cidade, até que eu cansei de andar, parei numa praça, sentei num banco e comecei a chorar. chorei tanto, mas tanto, mas tanto que se eu visse de fora até eu ficaria com dó de mim. eu nem sei porque eu estava chorando ou por que eu fiquei muito brava com meu pai. foi a pior meia hora da minha vida. eu poderia ter corrido pra elisa, ela faria tudo ficar melhor, mas eu não queria, queria ficar sozinha.

quando eu parei de me debulhar em lágrimas um pouco uma galera se aproximou de mim. três meninos, duas meninas, tinham duas garrafas de vinho, uma pela metade. acho que eles viram que eu estava mal e quiseram fazer algo, sei lá. começaram a conversar comigo, me deram vinho, cigarro, tudo que eles tinham. que bom que ninguém estava com droga, senão eu iria experimentar. aí eu fiquei bêbada, também, nunca tinha bebido de verdade. nós conversamos sobre um monte de coisas, foi divertido. até rolei no chão! nós ficamos na praça até alguma hora que eu não sei e depois fomos para um lugar mais escondido porque não queria que meu pai me achasse, se ele estivesse procurando. ficamos juntos até de amanhecer, depois foi cada um para a respectiva casa. fui a pé para minha, passei em uma padaria, comprei um refrigerante e fui bebendo no caminho. quando eu cheguei em casa não tinha ninguém.

a elisa me ligou de madrugada para saber o que tinha acontecido, atendi, contei por cima e disse que estava tudo bem, que tinha feito amigos. ela me pediu para voltar para casa e conversar melhor com ela, mas eu falei que nem ia porque era perigoso e tal. nem era perigoso, eu só não queria voltar e encarar meu pai. não quero olhar na cara dele. aí, ela me pediu para avisar quando eu chegasse. quando eu cheguei e não vi pai nenhum e nada de amante, liguei para elisa, disse que estava tudo bem, que eu estava em casa e que ia dormir. aí estou aqui escrevendo porque eu não consegui dormir e eu não sei o que fazer.

meu pai ainda não voltou, mas por precaução já tranquei a porta. eu não quero vê-lo, não quero conversar com ele, não quero qualquer coisa vinda dele. aff, não acredito que metade dos meus genes são de um fornicador compulsivo e a outra metade de uma mulher mal amada que descontava toda decepção na filha dela. eu não quero esse tipo de coisa para mim, não quero ser assim, eu não quero um pai que não respeita a memória da esposa morta e já traz putas para comer em casa e economizar a grana do motel. aposto que ele já estava com a clarice antes da mamãe morrer. e a clarice, aquela vagabunda, fingiu que era legal, fingiu que era só amiga do meu pai, fingiu tudo! aff... se eu a visse agora ia falar muito pra ela!

eu não quero ver meu pai! não quero ter que olhar na cara dele! vai ser horrível quando ele chegar, eu sei que eu não posso me esconder no meu quarto, nem fugir de casa para sempre, nem ser refugiada na casa da elisa porque acho que os pais dela não ajudariam nem um pouco nessa situação. odeio a vida! odeio meu pai! saco, vou tentar dormir e nem fodendo eu vou para escola amanhã. talvez eu vá, mas só para ver a elisa, eu preciso dela. mais tarde eu ligo para ela de novo pra explicar o que aconteceu.

odeio minha vida.

13.7.10

f5 - neurotransmissores fuderosos of doom

o sentimento de liberdade momentânea se aproxima por um momento: em teoria acabaram-se as lições de casa. agora só faltam alguns boletins, separar por aluno e ordem numérica, grampear e uma única reunião. daí o período aproximado de extensas duas semanas de puro ócio e divertimento a valer. eu deveria estar dormindo para fazer isso um pouco descançada para amanhã mas a excitação por duas semanas sem lição é tão grande que me faz não ter sono. lição de casa de aluno sempre tira o sono, ou é porque você tem que corrigir duzentas em quatro horas ou é porque elas acabaram e você vai poder assistir toda a porcaria que você baixou no hd, ir para o botecão prometido que tá quase virando a volta de jesus - já que não dá tempo porque fim de semestre é um cu, e escrever, ler, escrever e ler e escrever.

semestre longo. no meio dele já queria que a ciência provasse que lição de casa tem combustão espontânea e que aconteceu vanguardamente com as minhas, mas os cientistas ficam mais preocupados com coisas pífias, tipo o genoma ou a cura da aids, do câncer ou da lenda urbana da gripe do porquinho.

aleatoriedades:
adoro ver os ossos da minha mão. adoro bater algum osso e sentir dor de gente magra. adoro quando marca a mandíbula ou quando os tendões do pescoço ficam salientes. adoro quando meu aminguinguinho praguejento sai comigo. vou adorar muito quando meus fones novos chegarem. adoro violinos ao fundo das músicas. adoro microfonia no começo de músicas. adoro guitarras distorcidas. adoro voz rouca. adoro o som do ride quando ele é sequinho mas mesmo assim dá pra ouvir os harmônicos no meio da música. adoro café sem açúcar. adoro mostarda. adoro pimenta. adoro vodka pura.

adoro cigarros. aliás, se pá eu tô fumando demais de novo. ou não, se for ver, meus dias tem durado por volta de 30/36 horas. isso porque eu me forço a dormir, senão durariam mais. meus planos são de virar um zumbi em poucos anos. ficaria mais tempo acordada, se minhas costas permitirem. tô até gostando da minha dor nas costas absurda no momento, virei amiga dela.

às vezes é um saco ser eu e tal. mas na maior parte do tempo eu lucro bastante com isso, então, no complaints. queria acordar um dia, um diazinho só, no corpo de outra pessoa só pra saber como funciona a cabeça de alguém que não eu. acho que eu poderia aprender bastante sobre diversos temas, seria interessante. acho que vou estudar um pouco de sociologia durante as "férias", se pá tá faltando conhecimento um pouco menos básico na área. que a força esteja com lord google por seus serviços formidáveis à sociedade.

dica aos amiguinhos fumantes: quando seu cinzeiro começa a queimar sozinho é hora de limpá-lo. cheiro de bituca incinerada não é dos melhores.

é incrível o que um pouco de serotonina e endorfina brincando de roda com nicotina, cafeina (e mais algumas aminas) e um pouco de sono não fazem com uma pessoa. privação de sono é a nova droga, galerë, experimente, super dica. te deixa doidão, não gasta nada, você viaja sobre hare-krishnas, muito laranja e ex-namoradas de amigas suas. mas não é só isso, quando você atinge o patamar invejável de 48 horas sem dormir você fica com bonus-combo-cheat-special e supera qualquer droga ilícita que eu já tive o desprazer de experienciar os efeitos. quando quiser parar de brincar disso, é só assistir a um documentário em streaming no google videos em que a voz do narrador se mantém constante e tem um fundinho de música clássica pra dar o elã. zeitgeist addenum funciona perfeitamente comigo, às vezes algum da bbc, mas só às vezes, porque bbc é pra galere geral e não é trüe-mothafucka-roots como os independentes. o único problema é você derrubar o computador ou dormir com a cara no teclado e acordar com o padrão qwerty estampado em alguma das suas têmporas. funciona melhor que diazepam, o valium das terras tupiniquins. mas se você é uma pessoa chata e normal que não gosta de ver até onde você é capaz de chegar e dorme oito horas por dia, todos os dias tudo isso que foi escrito nas últimas linhas é totalmente inútil.

sexo gay, sexo lésbico, peitos, bunda, conto erótico, cu, ffuking ffantastic, two girls one cup, hardcore, bondage, submission, swallow cock, creampie, ass to mouth.

perdão as palavras, é só pra rir de quem for cair aqui depois por causa dessas palavras. webdevelopers, cheating on google since the begining of the malandropscity.

peguei e cansei. se pá vou dormir. provavelmente não, mas, né?

se pá em breve tem conto novo. amanda nova também vai vir por esses dias.

may the force be with you!

7.7.10

mais um!

REGINA, PUTA QUE PARIU!

5.7.10

o bolo

era aniversário de casamento de seus pais, dia catorze de outubro, cinquenta anos de união feliz, estável, respeitosa. ela não sabia, mas eles faziam sexo até a presente data, sua mãe nunca olhou para qualquer homem e seu pai jamais quebrou os votos que fez no dia em que disseram sim na frente de um homem todo vestido de preto.

ela era cheff de doces de um dos melhores restaurantes, sendo condecorada com prêmios algumas vezes durante sua rápida carreira. diziam que seus doces eram enviados por deus, jeová, maomé, mao tsé-tung, fidel castro porque eram quase tão bons quanto os doces que o senhor josé do boteco fazia. ninguém dizia que os ovos em conserva dele eram infinitamente mais saborosos e coloridos que os doces, mas o senhor josé também não gostava deste tipo de publicidade.

logicamente ela foi encarregada de fazer todos os doces da festa, uma vez que o senhor josé fora um desafeto na família desde que ele deu em cima de sua mãe por três anos consecutivos, outra vez porque ele cobraria preços exorbitantes que ninguém estaria disposto a pagar. todos acharam melhor manter as coisas em família, daria um ar de intimidade aconchegante para a festa de quinhentas pessoas que viriam - das quais trezentas e setenta e nove eram totalmente desconhecidas mas tinham status.

ela formou uma equipe com os melhores designers de doces, cozinheiros, avós e tias que ela conhecia. colocou-os todos em sua cozinha, delegou funções, formou equipes, estabeleceu prazos, metas e aplicou com maestria o conceito de linha de produção que mudou a história da humanidade. todos trabalharam com imensa sintonia e sincronismo que deixariam um relógio suíço com vergonha do trabalho mal feito e relaxado que sempre fez. o bolo seria dela, feito com destreza e alguns ingredientes secretos que ela mesma inventara. queria que o bolo fosse perfeito, digno de troféus, menções honrosas, fotos e análises para revistas especializadas, tanto por seu gosto único, sua textura firme que derretia ao menor contato com a saliva e sua decoração de extremo bom gosto e sofisticação.

todos trabalharam perfeitamente bem, as avós e as tias brigaram um pouco por divergências de métodos, umas diziam que o certo era mexer o creme em círculos no sentido horário outras diziam que o certo era desenhar um oito mexendo. a discussão só acabou quando um cheff passou pelas panelas que elas tomavam conta e ficou embasbacado com o jeito que elas usavam para mexer e disse que todas estavam fazendo muito errado e o jeito certo era desenhando de baixo para cima castelos com oito torres no sentido anti-horário em lugares que o clima era temperado e as coordenadas geográficas eram 453.78, -324.23. elas pararam de discutir e continuaram mexendo exatamente do jeito que sempre mexeram porque nunca prestaram atenção às aulas de geografia da escola.

quando a cozinha estava vazia e todos os doces já estavam sendo levados para o lugar que ficariam esperando a hora de serem comidos no dia seguinte ela começou a fazer sua arte. um bolo de seis camadas e meia, recheado de frutas silvestres e creme real, coberto com pasta americana multicolorida e decorado com fios dourados de marzipã. receita própria, com alguns ingredientes exóticos como noz moscada, molho de pimenta e glutamato monossódico. já tinha separado todos os ingredientes e tinha começado o trabalho duro de bater a massa para que ficasse homogênea e aerada. o forno já estava na temperatura ideal na hora que a massa estava pronta e ela a despejou em quatro formas diferentes e colocou-as ao forno. ajustou o timer e começou a preparar o recheio e a cobertura. tudo correu terrivelmente bem até a hora que ela sentiu o cheiro da noz moscada e lembrou-se da massa no forno. logicamente o timer não disparou, mas por que um timer faria seu trabalho se eles se divertem muito mais quando não avisam do tempo e as pessoas xingam muito?

tirou as massas do forno e por sorte, muita sorte mesmo, não estavam queimadas. em contrapartida, estavam totalmente desiguais, de um jeito que não daria para consertar, e ela não teria tempo para refaze-las. enquanto se preocupava com as massas, esqueceu o creme no fogo ligado e ele foi incinerado. labaredas chamuscaram a coifa e o teto. ela foi obrigada a usar um extintor que ela se orgulhou de nunca ter utilizado por cinco anos. obviamente, depois de tanto tempo parado ele não funcionou como devia e não apagaria nem uma única velinha de aniversário das mais baratas. ela, então, tirou sua doma e começou a batê-la freneticamente no foco do fogo do jeito que se faz em filmes, depois de uns cinco minutos batendo e metade da doma queimada ela se lembrou que se desligasse o gás tudo ficaria mais fácil. saldo final: uma doma metade queimada, um creme real destruído e ela teria que improvisar qualquer coisa com leite condensado, as frutas, amido de milho, leite e açúcar. naquela hora ela suspirou e pensou que nada mais poderia dar errado, ledo engano. decidiu que faria um creme com todas aquelas frutas exóticas batidas com os ingredientes que ela dispunha, mas na hora que ligou a centrífuga houve uma explosão de baixo porte mas que foi suficientemente grande para que queimasse o pobre aparato. quando estava prestes a começar a chorar inconsolavelmente como uma criança que perdeu o brinquedo favorito lembrou-se que tinha uma bancada, um rolo de macarrão e muito papel filme. embalou a bancada inteira em papel filme, colocou as frutas sobre o papel e as triturou com o rolo de macarrão com tamanha raiva e angústia que faria a finada centrífuga achar seu trabalho inadequadamente insatisfatório. enquanto fazia a pasta americana nada deu errado e ela estranhou efusivamente o acontecido.

por fim conseguiu fazer com que todas as etapas do bolo estivessem prontas e agora ela teria que ser malabarista para conseguir montar o bolo de seis camadas e meia com massas totalmente desniveladas, com um creme meio mole servindo de cimento e uma cobertura que não ajudava em nada para a estabilidade total da obra da engenharia que desafiaria a física moderna e tradicional se conseguisse manter-se empilhada por mais de dez minutos. tentou de muitos jeitos diferentes e o melhor resultado que conseguiu foi algo muito similar à torre de pisa. decidiu disfarçar a inclinação de quinze graus com um arranjo de flores bem volumoso e colorido, que ela compraria no dia seguinte a caminho da festa. quando ela estava limpando a cozinha e tentou mover o bolo para outro lugar e limpar a área que ele estava e suas camadas escorregaram entusiasticamente como num concurso de luta no gel. depois de alguns segundos ponderando chegou a impressionante ideia de colocá-lo na geladeira na esperança que o frio o enrijeceria e o tornaria mais apto ao transporte da cidade grande à chácara na qual a festa seria realizada. decidiu dormir na cozinha para não se atrasar no trajeto entre sua casa, pegar o bolo e ir para a comemoração.

acordou no dia seguinte duas horas atrasada, não pensou que o timer funcionaria, então programou o celular para despertar, mas não lhe veio à mente que a bateria iria acabar quando faltasse exatos dez minutos e trinta e três segundos antes da hora que tinha sido programado para tocar do jeito que aconteceu. mas, também, quem pensaria nisso? saiu correndo para pegar o vestido na lavanderia e, enquanto estava se trocando em um farol vermelho para ganhar tempo, um motorista bateu em sua traseira de um jeito que o carro só sairia do lugar se ele conseguisse milagrosamente uma cadeira de rodas - das elétricas. ela ligou para o seguro, disse o que houve, tomou um táxi e voltou à sua cozinha para pegar o bolo. pediu ao motorista que esperasse e disse onde iam, quando o motorista começou a chiar dizendo que não colocaria seu patrimônio na áera lamacenta e perigosa para aonde ia, ela mostrou o decote, deu uma piscadela e disse que o congratularia quando chegassem ao destino. o taxista, que era um estuprador em série, achou a ideia bem interessante e topou a corrida.

ela pediu ao taxista que fosse com muito cuidado e evitasse fazer movimentos muito bruscos para que o bolo não desmontasse inteiro dentro do carro. ele, que já estava planejando outros tipos de movimentos bruscos, concordou com o pedido e foi calmamente se dirigindo à chácara. mas em um farol vermelho, dois rapazes numa moto pararam do lado do motorista e um deles mostrou uma reluzente 45 cor de titânio e pediu educadamente pelo carro. ao entender a situação ela começou a chorar copiosamente como só quem tivesse vivenciado as mesmas coisas que ela desde o dia anterior faria. o taxista não entendeu. os assaltantes não entenderam. para falar a verdade, ninguém teria entendido o motivo de uma mulher com vestido de festa, sem maquiagem, com cara de sono e segurando um bolo torto no banco de trás de um táxi estaria chorando naquele momento. por mais incrível que possa parecer - e o que irá ser dito nas próximas linhas é realmente muito incrível -, os assaltantes notaram que aquele não era o tipo de choro desesperado ao qual estavam acostumados. ela ficou imóvel, atônita, chorando sem fazer barulho, com lágrimas rolando quentes por suas bochechas.

os assaltantes, comovidos com a mulher atônita, perguntaram o que tinha acontecido e ela começou a contar toda história, desde o sonho de ser cheff até o momento em que ela tentava desesperadamente chegar à uma chácara, no meio do nada, segurando um bolo que se mudasse de humor desmontaria inteiro e ela nem tinha dinheiro para comprar um bolo do senhor josé do boteco. os assaltantes se dispuseram a ajudá-la, um levaria o carro para onde os assaltantes levam os carros roubados e o outro iria com ela, de moto, até a chácara para a bodas de ouro de seus pais.

montou na moto de um jeito meio contorcionista para conseguir segurar o bolo de forma minimamente apropriada e partiram. como tudo estava dando absolutamente errado para ela, não haveria razão de mudar justo no momento que ela estava em um veículo de duas rodas, com um assaltante, segurando um bolo que implodiria a qualquer momento. um pouco antes de chegarem à chácara ouviram sirenes aproximando-se. conforme iam ficando mais perto, o assaltante se assustou, passou sobre um buraco relativamente grande para que a moto parasse abruptamente e ela saísse voando por sobre a moto. na queda ela quebrou um braço e outra coisa realmente muito incrível aconteceu - se você não achou realmente muito incrível na outra vez, deverá achar agora - o bolo permaneceu intacto, nem uma partícula de poeira grudou nele. o assaltante fugiu satisfeito sabendo que tinha feito a boa ação da vida dele e que teria uma vaga garantida no céu. felizmente, na hora do acidente, ela já estava bem perto da chácara e decidiu ir andando, contra todas suas expectativas nada de errado aconteceu no breve trajeto de cruzar a esquina do boteco do seu josé e colocar o bolo calmamente sobre a mesa.

enquanto seus pais corriam para ver o braço absolutamente torto da filha e já formava aquela comoção cheia de "ohhhs" e "ahhhs" ao seu redor, seu pai escorregou em uma pequena poça de champanhe que jazia largada, solitária, indefesa e entediada no chão e caiu de cara no bolo o destruindo completamente. para a poça aquela foi uma brincadeira divertida e ela teria gritado "de novo, de novo, de novo!" se qualquer pessoa tivesse paciência para aprender que padrão no qual as bolhas estouram é, na verdade, uma linguagem das mais sofisticadas faladas na galáxia. para o pai foi um dos momentos mais vexatórios da história de sua vida, só perdendo para o dia em que sua esposa pediu que tomasse a pílula azul. para ela foi como se tudo que houvesse de bom no mundo morresse no momento que o bolo fora destruído, sério, você jamais ficou tão triste quanto ela naquele momento. para o resto das pessoas só foi muito engraçado mesmo. pelo menos seu pai disse que o bolo estava muito saboroso.

2.7.10

férias

tô de férias daqui até eu cansar. e a vida vai bem, obrigada.
um beijo.

29.6.10

25/02/08

hoje faz dois meses que a mamãe morreu. sinto falta dela, mas nem é tanta. já tinha semi acostumado a ficar sem ela em casa por causa do tempo no hospital e tal. estou me dando super bem com o meu pai, a gente tem saído bastante e feito coisas tipo família. na maioria delas a elisa tá no meio. acho que ele aprendeu a lidar com a namorada da filha e encara como se fosse outra filha, sei lá. de vez em quando a clarice vai junto. acho que ele tá tendo um caso com ela, vou investigar melhor e ver o que eu descubro. se ele estiver tendo um caso com ela eu vou ficar muito puta. e nem sei por que, mas vou ficar.

as aulas voltaram semana passada, a amanda tá na mesma classe que a minha. tenho conversado bastante com uns dois meninos e uma outra menina. acho que os meninos são gays ou vão ser, a menina parece ser hétero. eles tem ficado perto de mim e da elisa na escola, passar intervalo junto e fazer trabalho, essas coisas. acho que só fazem isso por causa da elisa, que é super sociável e popular. não sei como ela consegue essas coisas e também nem sei como ela gosta de mim, mas o importante é que ela gosta. as aulas tem sido um saco, como sempre.

a elisa tem dormido em casa umas três vezes por semana, depois da viagem no carnaval com a família dela os pais dela tem estado muito legais com a gente. nossa! nem contei da viagem. os pais dela me chamaram para ir à chácara deles no carnaval, meu pai deixou, fui. foi super divertido, teve alguma festa estranha lá que é tradição na família dela, comi até sentir a comida na garganta. fiquei uns quatro dias lá, conheci a família dela bem nesse tempo e deu pra ver por que ela é do jeito que ela é. algum dia vou escrever tudo sobre a elisa, deve ficar mais fácil de entender alguém quando você escreve tudo sobre ela em um pedaço de papel. mas acho que os pais dela gostaram bastante de mim, e aí eles ficam mais legais comigo e com ela passando tempo comigo.

com a elisa tá tudo bem, estamos namorando oficialmente. ela que pediu, disse que eu a completava e que ela não precisava de mais ninguém. achei super fofo! temos nos dado cada vez melhor. tenho passado algum tempo na casa dela também, meu pai encoraja, acho estranho. eu tenho uma namorada agora, ela é linda e gosta de mim.

vou embora agora que eu tenho que fazer trabalho de história.

17.6.10

f5

eu teria que atualizar isso mas tenho preguiça. semestre tá acabando e eu tô cheia de trabalho, como todo fim de semestre.


depois escrevo algo melhor.

5.6.10

biografia dos doze alterada

joão, 27 anos, editor de vídeo. cheirava cocaína e bebia loucamente. nunca viu qualquer sentido na vida e a gastou toda tentando se divertir a valer. quando não estava bêbado ou entorpecido com qualquer substância, gastava seu dinheiro com prostitutas ou assistia pornografia. quando não estava fazendo qualquer dessas coisas ou tocava guitarra ou dormia. nunca teve qualquer relacionamento sério em sua vida, aparte da primeira namorada aos sete anos de idade, mas este ele não considera como um relacionamento porque nunca viu os peitos dela. morreu de cirrose hepática por abuso de substâncias e má alimentação.

pedro, 35 anos, pastor. desviava dinheiro da igreja, gostava muito de seduzir as beatas, principalmente as de quinze anos. gastava suas horas vagas fumando maconha nos fundos da capela enquanto algum menino fazia favores sexuais para ele. quando não fazia essas coisas, dormia ou estudava manipulação de massas e publicidade por conta para conseguir mais discípulos. foi assassinado pelo primo de uma das beatinhas que descobriu que ela não era mais virgem e que tinha sido o pastor o causador da desonra.

tiago, filho de marcelo, 45 anos, contador. era viciado em jogo e álcool. perdeu sua família pelos transtornos que causou. sua ex-esposa o processou por maus tratos e o proibiu de ver seu casal de filhos. nunca quis procurar ajuda e decidiu se livrar dos vícios sozinho. falhou miseravelmente. cometeu suicídio decepando sua mão esquerda e sangrando até a morte. não deixou carta de despedida e foi achado três semanas depois do ato, devido ao mau cheiro.

paulo, 52 anos, gerente de banco. masturbava-se compulsivamente, de duas em duas horas, o fazia mais por hábito do que por prazer. teve uma vida vazia do começo ao fim. nunca realizou sonho ou ideal algum porque sempre achava que a hora certa chegaria. foi encontrado morto no banheiro do banco em que trabalhava, estrangulado por sua própria gravata com a genitália à mostra. só ele sabe que foi o melhor orgasmo de sua vida.

judas tadeu, 14 anos, estudante. sua vida ia bem até dizerem que ele era um traidor de jesus diariamente por sete anos, quando, na verdade, não era. isso o estimulou a procurar um lugar em que seria aceito sem a ridicularização alheia. virou aviãozinho do traficante mais graduado da favela vizinha. foi morto em uma troca de tiros entre polícia e traficantes por uma bala perdida. sua mãe deixou de frequentar a igreja depois disso.

simão, 28 anos, jogador de futebol. foi criado por sua mãe que era diarista. nunca tiveram muito dinheiro e quando bem jovem decidiu que daria uma vida decente para sua família. através de muito esforço galgou seu caminho para o estrelato. quando estava em seu auge teve cinco mulheres e dois homens ao mesmo tempo. não assumiu nenhum dos quatro filhos que alegaram serem dele, comprou uma casa na periferia e deu à sua mãe. morreu de ataque cardíaco no meio de uma partida, o que ocasionou que seu time perdesse a partida e na perda de algumas centenas de milhares de reais em publicidade.

mateus, 37 anos, concursado e trabalhava na receita federal. nunca fez qualquer coisa que valha a menção, então sua vida foi o velho jargão da biologia: nasceu, cresceu, reproduziu-se e morreu. acidente de carro, ocasionado por um motorista bêbado.

tiago, filho de jeremias, 47 anos, professor de educação física. saía com alunos do colegial e comprava bebidas para eles. escolhia alguns deles e os matava. foi um assassino em série bem sucedido por 15 anos. nunca o descobriram ou chegaram perto disso. morreu quando escorregou em seu banheiro e bateu a cabeça na quina da pia.

andré, 34 anos, porteiro. armou um esquema para enriquecer formando quadrilha com ladrões que davam parte do lucro dos assaltos para ele. ele facilitava a entrada dos ladrões nos condomínios ou fábricas e logo depois se demitia. foi preso aos 32 anos e morreu em uma rebelião quando foi assassinado, aos 34.

felipe, 56 anos, recepcionista de hotel. homossexual assumido e declarado desde os 12 anos. foi libertino durante toda sua juventude, tendo perdido a conta de com quantos homens já tinha tido qualquer tipo de contato sexual. nunca usou qualquer tipo de proteção e teve quatro tipos diferentes de dsts. infectou muitas pessoas pelas casas de swing e salinhas escuras da vida. morreu em decorrência a uma doença oportunista quando sua imunidade estava muito baixa por causa do vírus da SIDA.

tomé, 45 anos, jornalista. usava de sua profissão para chantagear pequenos empresários e governantes menos graduados. ganhou muito dinheiro e deu uma infância muito confortável aos seus três filhos. teve algumas amantes e as levava em lugares caros só para mostrar que tinha dinheiro. foi uma pessoa moralmente desprezível durante toda sua vida. foi assassinado por um matador de aluguel pago por um político corrupto que estava sendo chantageado.

bartolomeu, 58 anos, exportador. anunciava em jornais empregos para moças na europa e lucrava muito as prostituindo de forma escrava. um pouco mais adiante em sua carreira descobriu que sequestrar crianças e vender seus órgãos no mercado negro era muito mais lucrativo e começou neste ramo, além disso fazia alguns trabalhos ocasionais vendendo bebês gorduchos e rosados para casais estrangeiros que sonhavam em ter filhos. foi morto "acidentalmente" em uma ação da polícia federal para desmantelar o esquema de venda de órgãos.

jesus, 33 anos, marceneiro. começou como marceneiro ajudando seu pai na oficina da família mas se cansou do trabalho pesado e decidiu que iria achar um meio mais fácil de ganhar seu sustento. com 13 anos passou a traficar drogas leves na escola e foi subindo de cargo com o passar do tempo. comercializou todo tipo de coisas ilegais, alcançando um império respeitoso antes da maioridade legal. apostas ilegais, prostituição, contrabando, tráfico, homicídio, era o rei de tudo. controlou tudo e todos sob seu domínio melhor que políticos, alguns até disseram que operou milagres na comunidade, mas também disseram que cometia atrocidades sem o menor pudor ou senso moral, contudo, enriqueceu muito e muito rápido. conseguiu uma legião de seguidores porque ninguém queria ficar contra o rei que foi filho do marceneiro. foi executado pela polícia quando um dos seus comparsas mais fiéis foi preso e o delatou em troca de uma pena mais branda.

26.5.10

o triste fim do pote de nutella

"você é meu nutella, é a dose diária que eu preciso de endorfina para conseguir viver durante o dia." ela disse em desespero pressentindo que aquela seria sua última conversa. estava triste, estupefatamente triste. tinha sobrancelhas, cenho, olhar que denotavam o tremendo descontentamento que ela sentia durante a conversa.

"mas você tem que entender que eu enjoei de nutella. tenho preferido sorvete ultimamente." ele resolveu ser gentil na hora de dizer que não gostava mais dela e que já estava com outra. "eu posso ser seu sorvete. você sabe que eu posso!" estava visivelmente desesperada, seus olhos gritavam por piedade, ajuda, qualquer coisa que a pudesse lhe tirar daquela situação. a angústia crescente vindo de seu tronco à garganta gerava aquele tom de voz típico de desesperados, o tom exato de quem implora pela vida diante de seu carrasco.

eles estavam no carro dele, ao portão da casa dela. ele havia tentado por vezes, ao longo do jantar, terminar com aquilo logo - todas sem sucesso -, tentou de forma clara e direta, com alusões, metáforas, algumas outras figuras de linguagem, toda e qualquer forma que ele achou que não seria tão rude quanto desenhar. "mas você não sabe ser sorvete, querida. você fica toda dura no frio, um duro que a colher não entra para pegar a parte mais gostosa. e sorvete, bem, sorvete casa com praticamente tudo. dá para fazer panetone de sorvete no natal, dá pra fazer sorvete empanado, dá para colocar qualquer cobertura, doce, fruta, chocolate e até nutella!". nessa hora os olhos dela marejaram, ela parecia algum animal acuado, indefeso, só esperando a hora que o predador tiraria-lhe a vida. naquele momento ela inspirava pena. "nutella combina com sorvete, tenha os dois!" ela estava desesperada, tentando se segurar na única linha que ainda não havia rompido e que dava sinais claros de que não aguentaria por muito tempo. "mas é sorvete de kiwi, kiwi não fica bem com nutella...".

olhou para ele com ultraje. "mas você disse que nutella ficava bom com tudo! agora não combina com kiwi?! então coma os dois separados!!". ele estava começando a ficar assustado, não encontrava qualquer jeito de dizer àquela mulher que ele estava se divertindo mais com outra. "querida, eu enjoei de nutella, preciso ficar um tempo sem para ver se eu sinto falta...". chorosa disse "mas você nem sabe se gosta mesmo de sorvete... ainda mais um tão exótico como kiwi!", ele desviou o olhar para o velocímetro e não conseguiu disfarçar o semblante de culpa. ela decidiu, então, usar do último artifício que poderia ter, pisoteando em cima de seu amor próprio por conta do desespero "eu sei que eu não posso viver sem você, e eu sei que eu nunca vou conseguir. eu não sei falar nada mais forte que eu te amo e que eu sei que ninguém que te ame possa te amar mais que eu. eu só quero estar com você."

ele se sentiu extremamente desconfortável com a declaração e tentou explicar de mais alguns jeitos menos incisivos, mas ela estava irredutível. cansado, entediado, incomodado, resolveu dar o golpe final misericordioso: "escuta, eu vou casar semana que vem. e não vai ser com você! dá pra entender isso, ou quer que eu desenhe?". ela o olhou com admiração e repulsa. pegou sua bolsa, saiu do carro e atirou a primeira coisa que poderia quebrar a janela que achou contra o carro.

ele saiu cantando pneus e ela entrou em casa, achou no armário da cozinha um pote de nutella pela metade. procurando uma colher, abriu a gaveta com tanta raiva que a derrubou. ao perceber a situação que estava, olhou para o pote em suas mãos e o atirou com fúria e desespero contra a parede. "filho da puta, me tirou até a nutella!"

24.5.10

a outra entrevista - parte II

para ler a primeira parte clique aqui

- nossa! eu nunca pensei que deus fosse uma criança!

ele tirou os olhos do papel, olhou para ela e disse:

- eu posso ter a forma que eu achar mais divertida. posso ser uma mulher, se eu quiser. um homem, um cachorro, um pássaro, o sol, a lua, o oceano, tudo que eu puder imaginar. espero que você não queira que eu mostre tudo isso, para juntar toda água do oceano de volta é meio chato.

ela estava estupefata com a visão de deus sendo uma criança que rabiscava almofadas e rolava pelo chão. então o todo poderoso, sabendo disso, se transfigurou em algo que ela pudesse reconhecer mais como o criador do universo e da vida em si. no entanto, as almofadas continuaram por lá e a iluminação continuou a mesma.

depois de presenciar a transformação da criança na forma que ela achava mais apropriada para deus, ela perguntou:

- mas o senhor não está ocupado com alguma coisa boba, do tipo governar toda vida do universo e tal? como tem tempo para me atender aqui sem nem me deixar esperando um segundo sequer?

ele, com toda calma respondeu:

- tenho o mau hábito de estar em muitos lugares ao mesmo tempo, e também faço muitas coisas por vez. as pessoas dizem que isso não é exatamente bom, mas é muito funcional, sabe? é muita coisa para fazer, se eu não pudesse fazer esse tipo de coisa, eu não teria tempo algum... e, na verdade, eu faço isso melhor quando estou dormindo. aliás, eu não governo toda a vida do universo, eu a supervisiono. mas, já que começamos falar desses assuntos burocráticos, você não acha que deveríamos começar a entrevista? burocracia por burocracia...

ela pegou seu gravador de dentro da bolsa, apertou alguns botões e disse:

- tudo bem, então. vamos começar. segundo a entrevista com seu encarregado do equilíbrio, o senhor tem grandes planos para nós...

- mas é claro! sempre tenho grandes planos para vocês. vocês foram uma das minhas experiências que mais me surpreenderam. e isso porque eu não esperava que vocês iriam evoluir da maneira que evoluíram. eu esperava mais, muito mais.

- esperava mais? em que sentido? por que?

- esperava mais porque vocês foram meu primeiro projeto e, acho, todos se enchem de expectativas com o primeiro projeto. mas aí, né, deu no que deu. pelo menos os seguintes funcionaram melhor.

- os seguintes?

- sim, tenho muitos outros projetos. todos mais bem sucedidos que vocês, não leve a mal, eu assumo o erro. provavelmente foi algo no meio do processo, acho que pulei algum passo ou algo assim. tento de tudo para tentar recuperar, mas ainda não consegui.

- tentar recuperar o que, exatamente?

- vocês, oras. mas não adianta o que eu faça, vocês sempre estragam tudo. já tentei fazê-los serem politeístas, não funcionou. já tentei inúmeros messias, não funcionou. já tentei fazê-los super crentes e tementes à força superior - que nesse caso, seria eu -, não funcionou. já tentei fazê-los acharem que são o máximo e que nada é melhor que vocês, não funcionou. coloco cataclismos, desastres, coisas bem estranhas mesmo e nada funciona. todos me falam para abrir mão de vocês, mas eu não consigo. até criei um diabo para fazer com que vocês tenham medo e comecem a fazer as coisas certas, mas nem isso...

- falam para você abrir mão? quem?

- os outros que vivem nessa dimensão. achava que eu morava sozinho? não é bem assim. vocês são o meu primeiro projeto em um centro de treinamento de criação. aqui tem muitos outros que fazem muitas coisas parecidas, melhores ou piores. tem um mundo todo por aqui, sabe?

- então isso quer dizer que somos pequenos, ínfimos, puntiformes, que não fazemos diferença alguma para qualquer coisa maior?

- não é bem assim, minha querida. vocês podem não fazer diferença para o meu colega que é estúpido, mas para mim fazem. para quem me conhece também fazem. e sobre o tamanho, sim, vocês são pequenos, da mesma forma que eu sou, da mesma forma que... ah, deu para entender a ideia, não? é uma cadeia sem fim de menor para maior, até hoje nunca ninguém conseguiu chegar no começo dessa cadeia, alguns procuram, outros acham que isso é o que faz tudo ser divertido, outros acham que tudo isso é idiota e nem se preocupam, alguns chamam isso de pi...

- tudo bem, eu entendo. você disse estar desapontado conosco. algo em particular?

- muitas coisas em particular. primeiro de tudo, vocês se matam. a tendência que vocês tem para matarem-se me fez perder muitos pontos e algum certo prestígio até eu conseguir fazer melhor em outra oportunidade. mas vocês se matam por tudo, por dinheiro, por inveja, por falta do que fazer e até por mim! e não importa o que eu faça, não importa que tipo de estímulo eu possa dar, vocês vão continuar se matando.

- estímulo? como assim?

- estímulo, assim mesmo. ou vocês acham que, sei lá, jesus, maomé, gandhi, einstein, mozart, arquimedes, sócrates, nietzshce, foram coisas do acaso? não, estes foram criados exatamente para fazer mais ou menos o que fizeram.

- você quer dizer que eles foram induzidos a serem excepcionais? e o tal do livre arbítrio?

- o tal do livre arbítrio não foi tocado. eles poderiam não fazer nada, mas fizeram. eles foram programados para isso, mas existia a chance de não funcionar. e, não se preocupe, esse tipo de coisa só acontece com alguns poucos de vocês, temos regras para isso, sabe? senão seria muito fácil criar o mundo perfeito. a grande maioria de vocês é gerada de forma aleatória de acordo com o que foi criado na raíz. por isso que eu digo que o erro é meu, para sair tanta coisa errada assim, só pode ser problema de raíz.

- e essas atitudes que você tomou, não surtiram efeito?

- ah, funcionaram na medida do possível. esse tipo de medida consegue mudar uma ou outra coisa, não tudo. eles são limitados a um número bem reduzido, todos eles fizeram o possível e conseguiram bons resultados. se uma pequena porcentagem de vocês se salva, é por causa deles. só tenho que pensar sobre o que eu vou fazer com esses que se salvam, porque deve ser um tanto entediante e revoltante viver em um ambiente assim...

- e sobre as orações e os pedidos que as pessoas fazem para você? você as ouve, faz alguma coisa sobre elas? como funciona?

- ouço todas. algumas são bem engraçadas, mas a maioria é extremamente entediante. me impressiona como vocês só pedem as sempre mesmas coisas e não fazem coisa alguma para consegui-las. nada cai do céu para ninguém; a não ser chuva, ou quando alguém daqui faz chover coisas estranhas, tipo, peixes para rirem de vocês. ah, e não faço nada sobre as orações, não posso, as regras, sabe? tenho que recuperá-los pelo meio certo, senão não farei progresso algum.

- interessante. e como você lida com as pessoas que o odeiam?

- ah, eu as ignoro. vocês tem mania de culpar qualquer um pelo próprio sofrimento, menos quem tem que ser culpado. cada um é o causador do próprio sofrimento, nunca terceiros. mas é mais fácil para vocês, eu suponho, culpar outros. do porquê é mais fácil eu só desconfio, então não vou falar minhas suposições porque eu posso estar errado, então mais gente vai resolver que me culpar pela torradeira que queima é algo legal de se fazer. vocês realmente se dariam muito melhor se parassem de culpar uns aos outros e começassem a assumir os próprios erros e lidar com as consequências. parar com essa atitude de: "oh, a minha vida não deu certo, é culpa do meu vizinho invejoso." ou "deus me odeia, ele só acaba com a minha vida, aposto que é um prazer pessoal.", nem vizinho invejoso nem eu fizemos qualquer coisa sobre a vida de vocês, foram vocês mesmos. só assumam e lidem com isso. esse comportamento não foi culpa minha, eu vi pelo passo a passo da criação. isso é característica de vocês mesmo.

- e por que você não termina com tudo? já que tudo está tão mal assim?

- porque me apeguei a vocês, oras. gosto de vocês, vocês me dão o desafio de encarar um erro absurdo que cometi todo tempo, vocês me dão chance de melhorar o que eu faço, de tentar reparar meus erros, de ir contra todos para fazer o que eu acho certo, o tipo de coisa que eu gostaria que vocês fizessem. se bem que vocês tem um problema de matriz e talvez tentem fazer isso, mas como o princípio está errado, a aplicação do resto fica conturbada... o que não impede de vocês tentarem.

- já que se apegou a nós, quais são as medidas que você vai resolver tomar daqui para frente?

- estou pensando ainda. provavelmente algo com diminuir o número de vocês, escolher os melhores e deixá-los fazendo o resto do trabalho, para ver no que vai dar. é um bom experimento, se funcionar posso conseguir a entrada para uma boa instituição. só por ter conseguido superar o tipo de problema que vocês apresentam. mas, para conseguir fazer isso, eu preciso de autorização, documentação em três vias, projetos e mais algumas coisas.

- e o que aconteceria com aqueles que não atingirem os patamares necessários?

- eles provavelmente serão mortos.

- e o que vai acontecer com eles, depois de mortos?

- exatamente o que eles esperam que aconteça. quem acha que não existe nada, vai existir coisa alguma, quem acha que vai para uma festa no pós vida, vai para uma festa. quem acha que vai para um mundo de coelhinhos brancos, é exatamente o que vai acontecer.

- é isso que sempre acontece?

- só nas ocasiões especiais. nas outras não é bem isso que acontece, mas não vou entrar em detalhes.

- por que?

- porque a resposta poderia afetar o desenvolvimento do projeto todo. e isso eu me recuso a fazer. já fiz uma vez e não gostei do resultado.

- afetaria como?

- vocês ficariam mais cheios de si, ou menos cheios de si. felizes ou decepcionados, no fim só ia gerar caos. vocês ainda não podem ter certeza das coisas, como os outros podem. é melhor deixar quem acredita acreditando, quem não crê não crendo e quem não sabe de nada não sabendo.

-você disse que os outros podem ficar sabendo das coisas e nós não. por que isso?

- porque eles estão mais evoluídos que vocês. isso não os afeta como afetaria a vocês, por isso eles podem saber de algumas coisas e vocês não. uma coisa que vocês sempre erram é que todos vocês sempre exigem a verdade mas nem todos sabem lidar com ela. a verdade gera desconforto, na maioria das vezes. desconforto gera tristeza. tristeza faz com que vocês façam besteiras. aí, vocês fazem mais besteiras e culpam uns aos outros. e assim sucessivamente.

- entendo. e como funciona o politeísmo, você já o mencionou na nossa conversa hoje. tem alguém que ajude a regular tudo?

- a dimensão de vocês não, nem as outras que eu criei. mas, como eu já disse, muitos por aqui criam dimensões. e cada um cuida das suas, porque se fôssemos dividir nós realmente brigaríamos muito. o politeísmo existe na dimensão de vocês, mas todos os diferentes deuses são diversas formas que me apresento, só para que vocês se sintam mais à vontade. então, quem quer venerar o sol, pode e deve. quem quer venerar o oceano, pode e deve. alá, deus, oxalá, adonai, krishna, zeus, thor, todos são eu.

- se todos são você, por que todas essas discrepâncias nas religiões?

- religiões foram criadas por vocês, porque vocês precisam de regras. então, a maioria das religiões existentes foi criada a partir de alguém que pensou muito sobre o assunto e decidiu que as leis de conduta e comportamento que deveriam ser seguidas são frutos, única e exclusivamente, da cabeça dele. e como eu não posso me manifestar, ficou assim.

- e sobre o diabo? bem, ele existe, os motivos da existência dele são mesmo aqueles que ele disse?

- sim. ele existe porque eu o criei. porque vocês só aprendem sofrendo, então precisava de algo que colocasse isso para vocês. não faço eu mesmo porque não posso interferir além de um certo ponto. na entrevista com seu pai, ele disse que era porque eu não gostaria de sujar meu nome. besteira dele! acho que ele está tão acostumado com o trabalho que desenvolve que se esqueceu de como as coisas funcionam mesmo.

- você disse várias vezes que só pode se envolver até tal ponto, sei que não é da minha conta e parece ser totalmente além do meu conhecimento e entendimento, mas por que você esta dando esta entrevista? isso não iria além do tanto que você pode desenvolver?

- sim, iria, e vai. consegui permissão usando a entrevista de seu pai e os dados que foram colhidos a partir dela. bastante gente levou seu pai à sério, mas muito mais gente achou que ele fosse louco ou um bom escritor de ficção. então, com esse argumento eu consegui demonstrar que a entrevista seria um sugestivo como qualquer outro que é facilmente colocado para vocês.

- e por que eu fui escolhida para essa entrevista? por que não qualquer outra pessoa?

- porque assim ficaria mais subjetivo, geraria mais dúvida e seria só mais uma sugestão mesmo. porque as pessoas vão se questionar muito mais sobre a sua entrevista do que elas questionaram seu pai. porque elas tem a visão de um deus intocável, todo poderoso, onipresente, onisciente, oni-qualquer-coisa que você quiser adicionar. e para deus conceder uma entrevista, a pessoa deveria andar extremamente na linha de todas as religiões ao mesmo tempo - o que é impossível. e, além de tudo isso, seu pai entrevistou o meu rival, pelo menos vocês gostam de achar que o diabo é isso, então, para muitos, a filha dele entrevistando deus vai soar como alguém que quer atingir tantas ou mais coisas que o pai. devo dizer foi decidido pelos outros que fosse você quem viesse me entrevistar, os que fazem as regras daqui.

- isso é realmente muito esperto. e que lugar é esse? é o céu? estou na sua dimensão?

- não, essa é só uma realidade paralela no seu próprio mundo. a viagem e as coisas para distraí-la foram colocadas mais como meios para você acreditar que está em em outro lugar, fazendo o que você foi chamada para fazer. e a sua crença nisso é crucial para que você leve tudo isso a sério.

- achei muito legal! queria algumas daquelas bugingangas para mim. e anjos, eles existem?

- todas essas coisas religiosas que você acreditar que existam, elas existem. a chave para tudo é acreditar. mas é lógico que se você acreditar que vai ganhar na loteria, só por acreditar e por achar que todo o dinheiro lhe faria muito bem, não vai funcionar. o problema é que muitos de vocês direcionam o acreditar para coisas erradas, então vocês não sabem do poder que vocês tem só por poderem acreditar em coisas.

- vou tentar disseminar esse pensamento.

- é exatamente por isso que você está aqui. para disseminar essas ideias. e acho que você já perguntou tudo que era possível ser discutido aqui. então, eu vou, infelizmente lhe mandar de volta para sua realidade. com pesar, porque sua companhia realmente é muito agradável.

- pena, o senhor é muito bom de conversa. mas, já que é necessário...

ele, então, olhou para ela, deu um sorriso, voltou a ser criança, deu uma rolada pelas almofadas e estalou os dedos. quando ela deu por si, já estava de volta no meio de transporte, com todas as coisas que a entreteram na viagem de ida. mas, desta vez, havia uma pequena placa com os dizeres: "leve o que quiser." ela sorriu e aceitou de bom grado os souvenirs.

chegando de volta, ela foi mostrar um dos presentes para uma amiga e ele desapareceu, então ela entendeu que não deveria mostrá-los para ninguém. publicou sua entrevista em uma revista de renome, escreveu livros, ministrou palestras, ganhou mais alguns rios de dinheiro para sua família e não viveu para ver o que deus estava tentando planejar para o mundo. ou então viveu exatamente o suficiente para ver o que ele estava planejando.

17.5.10

a outra entrevista - parte I

depois da primeira entrevista, depois do rio de dinheiro que sua família pôde ganhar com a experiência, ela se viu em uma situação que fora descrita milhares de vezes. estava indo para uma dimensão desconhecida com uma tarefa sublime tal qual como seu pai vinte e cinco mais cedo. ela estava nervosa, afinal ninguém jamais havia realizado tal feito, e esperava por algo parecido com o que havia ouvido.

até o momento tudo estava de acordo: a viagem estava agradável, sendo distraída com alguns objetos que eram absurdamente interessantes - para compensar a falta de janelas e de filmes que estava acostumada das viagens de avião. e não durou muito tempo, cerca de meia hora da partida à chegada.

quando chegou, foi conduzida por um ser de aparência extremamente humana para uma área que ela não entendeu muito bem o que era. havia algumas almofadas espalhadas pelo chão, algumas plantas, era um ambiente aberto, bem iluminado - mas que não era possível saber de onde a luz vinha, um tipo de iluminação que, segundo qualquer pessoa acostumada com o sol, deveria ser adotado em todo o sistema com vida, porque era esplêndido - e havia uma criança rolando por entre as almofadas. como quem a conduziu até lá não deu maiores explicações, ela assumiu que ele estava lá para entretê-la enquanto esperava.

olhou para os lados e decidiu sentar-se em uma almofada. não passou muito tempo e a criança veio falar com ela. eles analisaram-se durante algum tempo, ele parecia remotamente familiar. ela não saberia descrever exatamente o que lhe era familiar, mas parecia como se ela sempre tivesse conhecido a criança. além disso, ele parecia ser amável, educado e um tanto curioso.

- posso ver o que tem nessa bolsa, senhora?

- mmm... pode, mas para cada coisa que você pegar, você tem que me responder uma pergunta. quer brincar disso?

- tudo bem, parece divertido.

a primeira coisa que ele puxou foi um caneta. na mesma hora ele a destampou e começou a rabiscar uma almofada.

- ei! não, por favor, vai estragar a almofada!

e ela tirou seu bloco de papel e entregou à criança.

- ó, rabisca aqui, é melhor.

ele deu uma pequena gargalhada e perguntou:

- você está preocupada com a almofada? não precisa, eu conserto.

na mesma hora a almofada voltou ao normal e ele deu alguns risinhos ao ver os olhos admirados dela.

- nossa, que legal, almofadas escrevíveis! mas agora você tem duas coisas da minha bolsa, isso quer dizer que eu tenho direito a duas perguntas.

ele não parou de rabiscar e só consentiu com a cabeça.

- da onde vem essa luz?

ele parou, olhou para cima e disse:

- não te agrada? pode mudar, ó. fala quando tiver bom.

sem tirar os olhos do papel ele fez as tonalidades trocarem como um canal de tv durante alguns segundos enquanto ela olhava estupefata para o alto.

- não, não é isso, pode deixar como estava.

- ah, que bom, aquela é minha favorita de todas. dá para trocar também a paisagem, na verdade, dá para trocar tudo, quer ver?

- não precisa, gosto desse, mas obrigada por oferecer.

- é esse também é meu favorito. você tem mais um pergunta, não tem? mas posso te perguntar uma coisa antes?

ela assentiu e ele prosseguiu:

- o que você está fazendo aqui?

- eu vim falar com alguém, fui chamada e disseram que era muito importante, então estou aqui esperando, eu acho. agora é minha vez: quem é você?

- ah, eu? eu sou o que você chama de deus.


para ler a segunda parte, clique aqui

11.5.10

12/01/08

nossa, faz tempo que eu não escrevo aqui. tá, não faz tanto tempo assim, mas eu sei que nem sou o tipo de menina que desabafa com o diário. então, quando as coisas apertam, eu nem escrevo.

o enterro da mamãe foi acho que como todos os outros enterros. nunca tinha ido em nenhum antes, teve um padre falando por horas, como ela tinha sido uma boa mãe, uma boa esposa, um bom membro da igreja e tudo mais. o que eu acho que foi muito errado, porque a minha mãe nunca foi nenhuma dessas coisas, tirando bem no finzinho. meu pai até segurou as pontas bem. estava todo mundo lá. foi muito chato ter que cumprimentar todos e dar um sorrisinho quando eles diziam que sentiam muito quando nem sentiam. daí teve o caixão lá descendo e alguns parentes dela chorando. eu só fiquei com cara de cu o negócio todo. a elisa ficou do meu lado praticamente o tempo todo. meu pai olhava pra gente com cara estranha às vezes. meio que tentando entender e não imaginar coisas sexuais. e eu aposto que ele estava imaginando, as vezes ele fazia uma cara estranha. mas nem vou julgar, deve ser muito estranho para um pai perder a esposa e descobrir que a filha está com uma menina quando ela deveria estar com meninos.

depois foi uma galera pra casa. coitada da fabíola, que teve que cozinhar pra esse mundo de gente. parecia final de copa do mundo. eu cheguei em casa e me tranquei no quarto. a elisa foi também, já que eu tinha pedido pro meu pai e ele deixou. nos trancamos no quarto e ficamos deitadas, ela fazendo carinho na minha cabeça e eu olhando pro teto. ela começou aquela conversa de "vai ficar tudo bem" e tal. eu virei pra ela e disse o quanto estava feliz por ela estar lá. ela ficou olhando para mim com cara de boba, eu continuei falando que gostava muito dela e que não queria estar perto de mais ninguém. ela ficou com cara de idiota sorrindo, sabe aquela cara de criança que ganhou um presente? quando ela começou a dizer que gostava de mim eu disse que não precisava, que os olhos dela me diziam tudo que ela queria me dizer. tá, foi piegas, mas foi verdade. logo depois disso meu pai abriu a porta sem bater e se deparou com a gente deitada fazendo carinho nas mãos. ele olhou meio assustado, pediu desculpa, fechou a porta, bateu e eu falei pra ele entrar rindo. a elisa ficou meio sem jeito, mas eu achei a situação engraçada. ele disse para a gente descer que a comida estava pronta e saiu sem jeito.

a elisa olhou pra mim com uma cara de "que?!" e eu expliquei pra ela que eu tinha contado pra ele e tal. falei que eu tinha achado que já que ele estava super por baixo seria uma boa hora de contar, já que ele não iria brigar porque estava totalmente destruído. ela olhou pra mim assustada e eu falei pra ela ficar numa boa porque não ia acontecer nada. ele não ousaria fazer nada contra isso na fase que a família estava passando.

descemos, comemos, todo mundo foi embora. ficamos meu pai, a elisa e eu. ele veio querer conversar com a gente mas estava óbvio que ele estava incomodado. aí eu falei pra ele que nada precisava mudar, que ele continuaria sendo meu pai querido e que nada no mundo poderia mudar isso para mim. aí ele levou a elisa na casa dela, foi simpático com os pais dela, os agradeceu por deixarem a elisa passar tanto tempo comigo, já que a minha mãe tinha morrido e tal. e isso com nós duas do lado, foi embaraçoso. eles agradeceram por cuidar tão bem da elisa e tudo mais e disseram que enquanto ela quisesse estar comigo ela poderia e todas aquelas coisas de adultos.

voltei conversando com meu pai, ele explicou que precisaria de algum tempo para se acostumar, mas que nada mudaria em relação à elisa. ele disse que sabia o tanto que ela me ajudava e tudo mais. eu fiquei feliz por ele entender que ela era importante para mim. no dia seguinte levei café na cama para ele e comemos juntos.

não sei como ele está lidando com a morte da mamãe, ele continua indo ao psicólogo, o que eu acho ótimo. continuou tudo um tantinho normal nesses dias pós-enterro. só a clarice, colega de trabalho dele, que veio aqui algumas vezes, e ela foi super simpática comigo e tal. sei lá, espero que ele não esteja tendo um caso com ela. ela parece ser legal demais para que eu a odeie por um motivo tão bobo.

e eu vou parar de escrever, tá comprido demais isso e amanhã vou ver a elisa. s2.

5.5.10

ela

você já conheceu uma mulher forte? eu já. não estou falando de força física, é aquele tipo de mulher que causa espanto de alguma forma, chegando até a amedrontar. esse tipo de mulher aparenta que pode fazer qualquer coisa, a hora que quiser, com quem bem entender. isso amedronta, porque ela pode decidir fazer o que quiser com você.

eu a conheci muito tempo atrás, quando ela ainda não sabia todo o potencial que ela viria a ter. tenho a impressão que foi só por isso que pude me tornar próximo a ela. antes ela não selecionava tão bem as pessoas com quem se relacionava como ela faz agora. hoje em dia ela só deixa pessoas extraordinárias terem o tipo de aproximação que eu tenho com ela. e eu não tenho nada de extraordinário, sou bem do medíocre, se me cabe dizer. mas não é sobre mim, é sobre ela.

a primeira vez que a vi estava em uma festa. tinha acabado de chegar e estava num canto tentando achar onde estavam as bebidas. notei-a facilmente, ela destoa da multidão. todas as mulheres assim destoam, chamam atenção, e com ela não haveria de ser diferente. ela tinha cabelos compridos pretos, até a metade das costas, pele branca como se nunca houvesse visto a luz do sol, tinha o corpo perfeito: nada sobrando, nada faltando. fiquei alguns segundos reparando nela, ela era muito exótica para o tipo de pessoa que eu conhecia. nesse meio tempo um conhecido chegou. nos cumprimentamos e eu aproveitei para perguntar onde as bebidas estavam. ele me apontou ao local e eu fui pegar algo pra mim. enquanto estava curvado dentro do freezer tentando achar algo que eu gostasse de beber, senti uma mão em meu ombro me chamando. quando levantei e me virei para ver quem era tomei um susto. era ela, sorridente, com aquele olhar que só ela sabe fazer. ela perguntou educadamente o que tinha para beber e eu, calmamente, listei as coisas que tinha visto no freezer. ela pediu que eu pegasse uísque e quando eu perguntei se colocaria guaraná ou qualquer coisa para diluir ela só disse: "duas pedras de gelo.". não consegui esconder a minha cara de susto, até então não tinha conhecido mulher alguma que gostava de bebidas fortes. depois que eu preparei o drink para ela, ela me perguntou sobre a pessoa que estava dando a festa. eu disse que ainda não a tinha visto, mas que provavelmente estaria esperando a hora certa para chegar e chamar a atenção de todo mundo. ela concordou comigo, e disse que iria procurar pela pessoa. logo depois, virou as costas e saiu me deixando um tanto transtornado.

nosso segundo encontro aconteceu umas duas ou três semanas depois da festa. eu estava na fila do caixa do supermercado quando ela chegou com umas duas caixas de cerveja e disse que me conhecia da festa. me assustei, até então eu não imaginava que esse tipo de gente exótica saía de dia, sei lá, eles eram como morcegos para mim ou algo parecido. nós conversamos por uns cinco minutos e chegou a minha vez de pagar os produtos, nos despedimos e eu fui embora. até hoje acho que ela só veio falar comigo para furar a fila, apesar de ela nunca ter admitido isso.

o outro encontro só aconteceu uns dois meses depois, mais ou menos. um outro amigo em comum estava fazendo aniversário e achou que seria legal juntar as pessoas mais próximas em um bar para conversar e beber. fiz questão de estar atrasado, mais ou menos duas horas, todos eles demoravam muito para chegar e eu sempre detestei ficar esperando. quando cheguei quase todos já estavam lá. alguns amigos mais chegados me abraçaram e me apresentaram formalmente aos dois ou três que estavam na mesa, o que ainda não tinha acontecido. conhecia dois de vista e o terceiro era uma boa peça de cenário, já que ele não fez diferença alguma. ela era uma dessas três pessoas, estava cheia de anéis. acho que foi um pouco antes daquele dia que ela começou a usar anéis, não me lembro deles das outras vezes que a encontrei. abriram lugar para que eu me sentasse, e, por sorte ou ocasionalidade, era exatamente ao lado dela. o que as pessoas nunca lembram em encontros de bar é que você tem uma gama inferior de gente para conversar, já que, se houver mais de seis ou sete pessoas, você não irá levantar para falar com alguém que está na outra ponta da mesa. logo que me sentei, ela abriu aquele sorriso e disse algo mais ou menos assim: "então é você que é o famoso, certo? por que não chegou mais cedo? queria ter mais tempo para decidir se você é tudo que falam mesmo ou se eles não sabem descrever uma pessoa com exatidão.". eu dei um sorriso de canto de boca, daqueles bem sacanas, e falei para que ela não acreditasse em quem tinha dito boas coisas sobre mim, já que meus amigos são todos idiotas de alguma forma. acho que foi essa resposta que fez com que ela esquecesse do resto das pessoas e ficasse por horas conversando só comigo. depois de alguns meses de convivência mais próxima descobri que ela realmente se interessa por gente bem humorada.

nós não marcamos de sair os dois juntos durante os próximos seis meses. até então só nos víamos quando havia alguma reunião de amigos ou coisa parecida. e sempre que elas aconteciam nós ficávamos horas conversando sobre assuntos totalmente incomuns. ela é meio mística e ganhava uns trocados lendo tarot para as pessoas. hoje não são mais trocados, mas ela continua lendo tarot para as pessoas. descobri bastante coisas sobre ela nesse tempo. ela já tinha começado a ser a femme fatale que ela é hoje. quebrava corações com uma frequência absurda, mais ou menos um a cada duas semanas, usava todos os homens como queria e quando queria. nesse ponto ela era mais cafajeste que todos os homens que eu conhecia, inclusive eu. acho que cabe dizer que eu nunca tive nenhum tipo de queda por ela, sempre a olhei como alguém que admira alguma obra de arte. assumo que a ideia já tenha passado pela minha cabeça, entretanto. mas depois que a conheci melhor tive certeza de que ela não era para mim, não me daria muito bem com esse tipo de mulher.

a primeira vez que ficamos só nós dois juntos foi quando ela estava se mudando. ela estava saindo da casa dos pais, indo morar sozinha e precisava de ajuda para instalar chuveiro, essas coisas, que segundo ela, são coisas de homem e que ela sempre se negou a aprender. e como o pai dela estava ocupado com alguma coisa, eu era o único homem que sobrava que ela conhecia que não queria nada sexual com ela. fui lá e fiz meu papel de macho alfa. depois que terminei de arrumar todas as coisas, nós sentamos, bebemos coisas e conversamos mais. até uma hora que ela me mandou embora, literalmente, porque estava esperando alguém chegar. não duvido que estivesse esperando alguém de fato, quando eu saí do elevador no térreo dei de cara com um cara com cara de babaca que fazia bem o tipo dela. ri comigo mesmo e fui para minha casa. na próxima vez que a encontrei, perguntei sobre aquele homem, ela riu e disse que ele não havia passado no teste. eu ri porque eu sempre soube sobre o que era o teste dela.

nós ficamos muito próximos e ela foi ficando cada vez mais forte, cada vez mais bonita, cada vez mais categórica. na cabeça dela só existiam dois tipos de coisa: as que ela gostava e as que não tinham motivo para existir. as últimas ela fazia questão de excluir de todo seu entorno sem a menor dúvida ou problema. elas as liquidava, simplesmente. quantas amizades desfeitas, quantos bate bocas, quantos corações partidos... não o dela, suponho que homem algum nunca tenha conseguido magoá-la a ponto de partir-lhe o coração. nessa época que ela estava descobrindo o tamanho da força que tinha ela ficou praticamente insuportável. talvez seja porque justamente nesse tempo eu fui morar com ela.

é, fiz essa besteira. ela morava sozinha, eu estava com alguns problemas, éramos amigos bem próximos e fui morar lá. não aguentei dois meses. ela tinha uns horários absurdos: resolvia limpar a casa toda às duas da manhã ouvindo rock dos anos sessenta, me acordava às quatro da manhã com um bolo quentinho perguntando se eu queria um pedaço, isso quando ela não chegava com um monte de gente sei lá de onde para terminar a noite. não deu, foi o jeito mais rápido que eu sempre encontrei para ter um lugar meu para ficar. era só passar uns dias na casa dela, muito mais eficaz que a minha mãe querendo controlar meus horários.

o incrível é que ela sempre teve muita gente ao redor dela. gente que ela ajudava, gente que só ficava por ali mesmo, gente que gostava dela e uma pequena legião de homens - e algumas mulheres - que queriam ser o amor da vida dela. acho que ela sempre achou graça de tudo isso. ela sempre achou incrível como as pessoas poderiam gostar dela se ela não se esforçava para que isso acontecesse. e depois de um tempo ela não deixou quase ninguém conhecê-la de verdade, ela sempre me disse que era por proteção, nunca discordei. mas uma das coisas que mais me impressiona é que eu nunca a vi pedindo ajuda para qualquer pessoa. provavelmente ela sabia que ela era uma das mais fortes e que ninguém seria forte o suficiente para ampará-la. é óbvio que ela teve seus momentos de crise, mas como ela lidou com eles eu nunca soube.

depois de certa época na vida, ela sempre fez o que quis, a hora que quis e do jeito que quis. e ninguém era forte ou louco o suficiente para ir contra ela ou contra o que ela queria. tanto que eu estou aqui, ainda falando sobre ela no presente, enquanto eu estou fazendo sua última vontade. falar sobre ela, sem ter preparado nada, sem nem ao menos ter pensado sobre o que eu iria falar porque ela sempre quis espontaneidade perto dela. só fui avisado mais ou menos quinze minutos atrás. todos que estão aqui concordam que ela é o tipo de pessoa que muita gente conhece, mas que pouca gente tem o mérito de conhecer como é de verdade. eu posso dizer que sou privilegiado, porque eu realmente a conheci de verdade, já que sou eu que estou aqui falando sobre ela para vocês. me sinto honrado ao fazer isso, já que ela pediu em uma carta cheia de sentimentalismos e chantagem emocional para que eu estivesse aqui. só li essa carta há pouco, falo mais uma vez, mas a conhecendo como eu a conheci, por mais de trinta anos, sei que ela não faria diferente por qualquer razão.

mais de trinta anos convivendo com ela praticamente diariamente, e é a primeira vez que algo a venceu. e mesmo depois disso, ela continuou mostrando que sempre a vontade dela era a que prevalece. mulher forte. nunca fique muito próximo de uma mulher forte, ela vai marcar toda sua vida. conselho de amigo, eu fiquei perto demais e eu nunca mais serei o mesmo.

3.5.10

f5

conto novo em vias de. preciso lembrar de colocar amanda aqui.

28.4.10

eu deveria estar dormindo

eu deveria estar dormindo, mas estou aqui, escrevendo. por que raios, se amanhã vou ter que trabalhar porque está rolando o inferno naquela escola? tem gente com muleta, com pedra no rim, gente indo fazer fisioterapia, gente com membros deslocados e gente na uti. está praticamente um ambiente pós-batalha no século XVIII. e eu deveria estar dormindo.

antes que você pergunte, se é que você iria perguntar, a vida vai bem, obrigada. nada demais, nada de menos. se não fosse minha preguiça me assolando aposto que já teria começado a fazer o que eu acho que eu tenho que fazer, se bem que isso não diz respeito a você. acho que é só pela falta do que escrever mesmo.

suponho, mas só suponho, que a maré baixa de criatividade esteja passando. isso quer dizer que talvez, mas só talvez, haja mais textos nesse humilde espaço tosco da grande rede. e ainda estou assolada por ter que trabalhar praticamente todos os dias da semana. não, eu sou melhor que você e trabalho só nos dias que eu quero e ninguém se importa muito com isso. não fossem os infortúnios provindos de mau-olhado, uruca, macumba, inferno astral, seja lá o que se passa no meu ambiente de trabalho, eu teria trabalhado dois dias na semana.

o que eu acho mais incrível é que todo mundo se fode de algum jeito e eu tô aqui, firme e forte. e aposto um biscoito de chocolate que algo terrivelmente ruim acontecerá comigo só porque eu disse isso. mentira, nem aposto. mas eu realmente não me importaria se algo terrivelmente ruim acontecesse comigo. se acontecer, como boa alma que sou, postarei para que seja sanada a curiosidade do leitor.

o teste para ver se eu conseguiria escrever bêbada foi um fiasco. não tinha vodka suficiente para me deixar bêbada. sempre comento que eu detesto ser absurdamente forte para bebidas. e descobri que é qualquer bebida. bebi uns cinquenta mililitros de molho de pimenta (nem sei se foram cinquenta mililitros, mas foi um quarto de copo, que eu suponho, que comportava duzentos mililitros.) e nem aconteceu nada comigo. nada. só meu canal auditivo que ficou um pouco picante durante uns trinta segundos e acabou. isso, definitivamente, não é normal.

tenho brincado bastante de tirar fotos. tirar fotos é legal. algum dia vou sair sozinha pra tirar fotos de lugares. apesar de querer sair sozinha acho que é mais prático sair com algum homem grande que inspire medo para não ser roubada.

que fique o registro: acho a última parte do verão de vivaldi simplesmente perfeita. o crescente de violinos é formidável. mas eu deveria estar dormindo.

vou tentar dormir, apesar da certeza que demorarei horas e que terei milhões de ideias incríveis para escrever e não as escreverei, porque eu saberei que se sair da posição que eu estiver eu não vou conseguir dormir nunca, e, provavelmente o dia que estiver a se passar será horrível e eu entrarei para a lista de pessoas com algum problema grave no quadro de colaboradores do meu estimadíssimo ambiente de trabalho.

eu deveria estar dormindo, mas estou aqui, despejando um monte de asneiras porque o sono foi até a esquina dizendo que ia comprar um maço de cigarros e ainda não voltou.

23.4.10

sedução

ela esperava ansiosamente em seu trabalho pela chegada daquele ônibus. 7 2384. tinha decorado o número para saber de antemão que era ele quem havia chegado e já preparar o pingado e o saquinho de pão de queijo que ele tanto gostava. ele não precisava nem pedir, quando chegava ao balcão já estava tudo pronto à sua espera. ela parava qualquer pedido de qualquer cliente para preparar o de seu favorito.

ele era cobrador da linha que fazia ponto final em um terminal de ônibus e metrô bem movimentado. sempre usava a camisa encardida do uniforme com três botões desabotoados, óculos escuros como colar e passava gel que deixava brilho molhado no cabelo com luzes. ela a era atendente da lanchonete com quem ele sempre flertava.

se conheceram no clube de campo, quando ele estava saindo de uma partida de tênis e ela do treino de natação matinal. os dois estavam no restaurante do clube tomando café da manhã, ele não parava de olhar pra ela e ela não parava de fazer poses porque viu que tinha sido notada. ela era herdeira de alguma empresa enorme e ele era vice-diretor sul-americano de uma multinacional. como manda a etiqueta, ele tomou a iniciativa e pediu ao garçom que entregasse uma salada havaiana para ela. ele fazia isso todos os dias anonimamente.

a primeira vez que se falaram foi quando ele pagou a conta dela antes que ela pudesse tê-la pedido e quando a herdeira perguntou quem havia pago ao garçom ele indicou o vice-diretor. ela agradeceu indo à sua mesa perguntando se ele não gostaria de pagar o jantar algum outro dia e deixou seu telefone.

o cobrador, depois de três meses tomando pingado e comendo pão de queijo de graça, chamou a atendente da lanchonete para ir ao forró. ela não aceitou de primeira, preferiu dar a resposta três dias depois, para se fazer de difícil - e também porque já tinha marcado com benga, o pegador do bairro. ela desmarcou com o benga prometendo dar a ele uma recompensa, ele pensou que ela finalmente iria liberar o botão e nem ficou transtornado com a ideia.

no forró eles dançaram tanto que os dois saíram com os pés sujos. antes da metade da noite o cobrador já tinha aberto a camisa rosa mostrando seu torço não tão bem torneado e a atendente já tinha sido tão encoxada que ela se sentiu no ônibus intermunicipal das seis da manhã algumas vezes no decorrer da noite. ele pagou a ela duas doses de pinga com mel para que ela ficasse mais propensa a outras coisas, ela aguentou firme e não liberou nada para que ele não pensasse que ela era fácil.

na manhã seguinte à conta paga, ela, notando que o vice-diretor estava lá, foi até sua mesa e perguntou se aquela cadeira estava ocupada. ele tirou os olhos no laptop e ficou um tanto assustado com a postura da moça, mas relevou, eles eram ricos, tinham todo direito de serem excêntricos. tiveram um café da manhã agradabilíssimo, ladeado por posições sociais e filosofia pós-moderna. descobriram que tinham pontos de vista compatíveis, e era isso que ela buscava, e o que, para ele, deixava uma mulher interessante. o encontro para o jantar veio na noite seguinte, sendo marcado para a próxima semana porque a herdeira tinha uma viagem inadiável até o fim de semana seguinte. não era verdade, mas ela queria que ele acreditasse veementemente nisso - mesmo que fosse prejudicar seu treino de natação por não ir ao clube por praticamente uma semana.

no dia do jantar, ele chegou mais cedo e deixou aos cuidados do vallet um pequeno ramalhete discreto de lírios casablanca para ser entregue à herdeira quando chegasse. fez questão de que o vallet decorasse o pequeno texto de duas linhas e o congratulou com cinquenta reais, e disse que se fosse bem feito, daria outros cinquenta. as flores surtiram o efeito esperado, ela passou o jantar inteiro mais receptiva e amigável, dando sinais de que a elegância era o que ela mais apreciava em outra pessoa.

quando o cobrador voltou ao ponto final, pela primeira vez depois do forró, ficou tanto tempo conversando com a atendente que atrasou a saída do ônibus - se é que um ritual animalesco de acasalamento verbalizado possa ser chamado de conversa. quando ele chegou pela segunda vez ao ponto final ele a chamou para ir para um boteco que disse ser muito bom e ter coisas baratas, ela não sabia que esse bar ficava no mesmo quarteirão de um hotel barato que fazia promoção às quartas-feiras e aceitava ticket alimentação como pagamento.

eles foram ao bar e conversaram sobre muitas coisas, ele mostrou a ela como as coisas funcionavam em uma empresa de ônibus e ela revelou que todos os salgados da lanchonete eram terceirizados e vinham congelados. ele pagou diversas bebidas, ele sabia que mulheres ficam mais acessíveis quando bebem um pouco. ela, controlando a situação, bebeu só até o ponto em que ficaria mais solta para fazer o que ela chamava de "loucuras".

saíram de lá e foram para o hotel. ela teve uma noite que até valeu à pena e ele achou que todo dinheiro gasto - ao todo R$67,35 - não foi tão bem investido. ele não sabia que o tanto de pão de queijo e pingado que ele conseguiu de graça ultrapassava bastante o tanto que ele gastou.

depois do jantar, o vice-diretor ficou três dias afastado do clube, mandou uma mensagem de texto para a herdeira dizendo que estava em uma viagem de negócios em algum país da américa do sul. quando ele voltou, a herdeira já planejara algo que fosse memorável: sentou-se com ele na mesa do restaurante do clube e pediu de forma séria que ele desmarcasse todos os compromissos do dia. ele pestanejou um pouco, mas cedeu depois de remarcar os encargos mais importantes. ela, então o levou para um dos iates da família e informou que durante aquele dia ele estaria aos cuidados dela.

no iate, depois de algumas taças de champanhe da mais fina safra e depois de uma tarde formidável aconteceu o que havia de acontecer. ela ficou satisfeita por ter sido a primeira vez que algum acompanhante não houvesse ficado mareado, ele aproveitou a tarde, mas desgostou consideravelmente o tipo de atitude autoritária que ela demonstrara ter.

poucos dias depois do hotel, o cobrador informou à atendente que a chefia o havia mudado de linha e ele não estaria mais no ponto final todos os dias. ela não sabia que ele tinha pedido para mudar de itinerário porque ele não queria mais vê-la. ela ficou triste, porque teria que voltar aos braços de benga, o pegador do bairro, e tinha achado que o cobrador dançava forró melhor. ele deixou um número de telefone, visivelmente errado para que ela nunca mais conseguisse entrar em contato com ele.

no restaurante do clube, durante um dos alguns encontros que tiveram lá, o vice-diretor deu a notícia derradeira de que conseguira uma promoção e seria transferido o quanto antes para a filial da argentina. a herdeira não ficou impressionada, nem demonstrou qualquer excitação quando recebeu a notícia. mas isso só porque ela não sabia que ele estava mentindo e que realmente não iria para outro país, tampouco tivera alguma promoção. ele ainda se deu ao trabalho de responder algumas mensagens de texto até se cansar e dizer que havia se apaixonado por uma dançarina de tango. mas, nesse momento, ela já tinha o esquecido. estava envolta em outra aventura com um cobrador de ônibus, que conhecera quando o veículo em que ele trabalhava se chocou contra a traseira de seu carro no farol vermelho de um cruzamento perto de uma estação de metrô.

16.4.10

monólogos sobre a amizade. parte II

sinta-se privilegiada, escrevo sobre você ouvindo vivaldi. não é pra qualquer um. como todo e qualquer amigo ou conhecido meu, você é completamente desajustada. é pré-requisito e tal. apesar de ser desajustada, desregulada, demente, compulsante e todo e qualquer adjetivo degradante que possa vir à mente no momento, incrivelmente, você consegue superar todos eles com as coisas boas. e isso é bem insano.

você me entende, sabe porque eu faço uma ou outra coisa, ficou do meu lado quando o mundo resolveu que ia ficar todo trabalhado no mimimi melodramático e ridículo. só você e ele tiveram colhões pra fazer tal coisa e é por isso que eu amo vocês dois. amo do meu jeito, que nem é um amar tão direito assim. mas, olha só, você nem se importa.

eu te detesto por várias razões. detesto que você seja tão parecida comigo em muitos aspectos. detesto que quando a gente passa noites e noites conversando e divagando sobre nossas brisas meio dementes eu chego conclusões excruciantes sobre mim, a vida, o universo e tudo mais. te detesto por respeitar nosas diferenças abissais que começam na música e passam por todo tipo bizarro de coisa. o que não é igual é antagônico, e você sabe respeitar isso, e eu te detesto por isso também.

no dia que eu te encontrei eu tava meio bêbada, acho que foi a penúltima vez que eu fiquei bêbada. fui parar na sua casa sei lá como, depois trocamos horas de papo juntamente uma à outra. acho que só chegamos onde chegamos tão rápido porque eu tava meio bêbada naquele dia. o que mais me espantou é que depois da hora de papo trocada parecia que eu te conhecia há milênios. aquele sentimento fraternal de estar em casa meio bizarro que só acontecem com certas pessoas, e, adivinha, te detesto por isso também. você respeita minha falta de memória latente e já começa frases com "eu sei que você não se lembra mas...", você decide a minha vida por mim e só me informa do que irá se suceder. e eu te detesto por isso também. te detesto por mais algumas dúzias de coisas.

na verdade, eu detesto como você se fez presente, se faz presente e se fará presente. esse tipo de coisa me incomoda. porque eu sei que no fim, naquele fim lá, o último deles, você vai estar lá. nem me pergunta por que nem como eu sei, mas eu sei, e você sabe que quando eu sei das coisas eu realmente sei delas e elas acontecem. isso me dá medo porque você não vai deixar que eu enjoe de você. porque mesmo quando eu tiver enjoada, você vai estar lá conversando comigo e me mostrando coisas que eu não veria sozinha, e vai me mandar a merda por estar enjoada e realmente vai ignorar o fato e fazer tudo normal.

acho que não expliquei bem o motivo de eu te detestar tanto. eu detesto tudo isso porque eu realmente amo tudo isso em você. e destesto porque, por mais que eu saiba que não vai acontecer, no dia que você for embora - ou eu, vai saber - vai ser mais chato do que no dia que muita gente for embora. detesto tudo isso porque é meio que insubstituível. ninguém vai ter a sinergia que a gente bizarramente tem. ninguém vai entender a minha sinceridade do jeito que você entende. ninguém vai ver o que você vê, e que pra você - e só pra você - eu deixo explícito, sem surtar ou fazer qualquer coisa mais detestável. acho incrível como você não acha nada bizarro.

lembra como eu surgi do nada na sua vida e que nas duas próximas semanas ao nosso primeiro encontro eu praticamente morei nos fins de semana na sua casa? lembra que coisa mais absurda, naquele fatídico dia que nunca mais cresceu grama no canteirinho, uma galera surgiu do nada e eu fui com você pra sua casa pra ter certeza que você ficaria bem? gastamos uns cinquenta reais com doce e refrigerante e panguamos na sua casa fumando muito, falando muita bosta, você chorando esporádicamente, eu falando do seu futuro e ouvindo música estranha? lembra que eu disse que ia ficar tudo bem e que ia passar e você ia rir daquilo tudo? e no fim até que ficou. tá ficando. uma hora fica, sempre fica.

eu acho fofo como você tenta reconciliar as pessoas que não entendem as coisas que eu faço. acho fofo mais do que chato ou trazedor de drama. ah, detesto como você não faz drama nenhum comigo. eu detesto tanta coisa em você, mas tanta coisa.

lembra aquele dia que todo mundo tava dormindo, não tinha lugar pra gente dormir e ficamos divagando sobre aquelas coisas doidas? a conversa tava super interessante e fomos interrompidas por uma cliente da cantina da potyra? cara, aquela conversa me trouxe o que eu precisava. um tantinho a mais de temperança. acho bizarro como você tá sempre por perto nas horas que a temperança dá um oi.

não é porque você tem praticamente a minha idade, nem porque a gente já passou por muita coisa parecida, mas eu vejo em você alguém que eu possa contar também. porque ser sempre quem é mais calmo e quem pondera mais sobre os assuntos e aconselha é cansativo. é bom ter alguém que possa fazer essas coisas pela gente de vez em quando. acho legal também como a gente reveza na hora de fazer essas coisas. uma sua, uma minha, vice-versa.

obrigada por eu saber que você vai invariavelmente estar lá por mim, por qualquer motivo, em qualquer hora. você vai estar lá. obrigada por se detestavelmente insubstituível. obrigada por entender como a minha cabeça funciona. obrigada por entender a minha sinceridade. obrigada por entender todos os meus lados e minhas facetas e minhas vertentes e minhas personalidades. obrigada por passar noites em claro comigo. obrigada por ter impedido que eu pegasse alguma dst. e meu, isso tudo ficou muito mimizento.

7.4.10

a grande questão fragmentada

onde você procura? em si mesmo? em outra pessoa? no seu trabalho? na sua família? já conseguiu achar? já conseguiu tudo que queria e agora quer mais? quer outras coisas? o que você quer? como você quer? do que você é feito? como são as coisas para você?

seu trabalho é agradável ou é só uma ferramenta para conseguir as outras coisas? seu namoro, casamento, rolo é satisfatório ou serve só para passar o tempo? você realmente pensa que vai achar em outra pessoa? ou será que você mergulha em si mesmo para ver se acha a resposta em algum lugar inexplorado do seu ser? como você reage às situações? para que serve tudo isso? uma cortina de fumaça, talvez? separando você da tão almejada resposta? do grande sentido que ninguém nunca conseguiu explicar? será que tudo foi criado para que não fiquemos loucos tentando achar? deuses, religiões, culturas, absolutamente tudo?

como você se sentiria se tudo fosse uma farsa? se tudo não existisse na realidade? se tudo fosse um grande teatro consumado e intrinsecado na cultura mundial para que tudo ficasse menos difícil? como seria se tudo que você acredita não passasse de alguma fábula contemporânea cheia de facetas e caminhos e transgressões? o que você faria? o que te faz acreditar? o que te faz continuar seguindo por um caminho que você não tem a mínima ideia concreta para onde te leva? e se não te levar à nada? e se nada do que te disseram é ou alguma hora foi verdade? você já se perguntou essas coisas? você já quis saber os motivos cósmicos sobre tudo isso?

o que te faz continuar namorando com alguém? o que te faz querer casar com alguém? o que te faz conviver com alguém? carinho? amor? solidão? a esperança egoísta de achar algo que dê um sentido? que aponte um caminho? se seja seu provedor infinito ao que lhe falta? ou você é só egoísta? você consegue assumir isso? você consegue assumir que, na verdade, você está pouco se fodendo? você consegue perceber que você tenta fazer seu parceiro feliz só para que ele não lhe deixe sozinho sem nada para se amparar? ou você é um daqueles sonhadores épicos que acredita em alma gêmea ou num cavaleiro de histórias de princesas?

o que te faz levantar pelas manhãs? o que te dá forças para sair da cama? você liga o piloto automático e vive um dia após o outro, sem maiores inspirações? ou será que você já está cansado de tudo isso? será que você já desenvolveu nojo por toda a sociedade e pelo jeito que ela te moldou? você entende o motivo do seu emprego? entende o motivo de você achar que precisa dele? será que dinheiro é tão importante assim? já pensou em formas menos corrosivas de conseguir o suficiente para que você viva? já pensou em como um mendigo pode ser mais feliz que você? já pensou que talvez a simplicidade da vida dele seja a chave para tudo que ele sempre sonhou? ou você é um daqueles que os julga sem ao menos notar sua própria insignificância? você se colocaria no lugar de algum deles?

você está vivo só por estar ou você tem um objetivo maior? você quer fazer diferença? que tipo de diferença você quer fazer? seu ego é grande a esse ponto? ou você só quer fazer da sua vida algo insosso e simplório que não lhe dê muito trabalho? você acha que tem que fazer alguma diferença para alguém? você acha que você deve ser melhor e maior e mais preparado do que os outros? você acha que você é ou pode ser tudo que você sempre quis? você tem um sonho? você pretende realizar seu sonho? ou você só o vê como coisa utópica inalcansável? você acha que sonhar é para poucos? você tenta realizar seu sonho?

você busca algum tipo de individualidade? você tenta ser você mesmo e não o que os outros desejam que você seja? você já desenvolveu alguma espécie de pensamento crítico? se sim, tem bases sólidas em algo filosófico? ou será que a base é experiencial? será que a base é sólida assim? já pensou que talvez uma simples brisa pode fazer ruir todo o seu ponto de vista? o que seria de você sem ele? o que seria de você sem as coisas que você acha que você deve ter?

o que seria de você sem amor? o que seria de você sem o mínimo dinheiro necessário para que você mantivesse suas assim chamadas regalias da vida moderna? o que seria de você sem sua comida superfaturada? o que seria de você sem o seu controle remoto? sem a sua diversão? sem o seu entretenimento? o que seria de você sem suas obrigações? necessidades? o que seria do mundo se não fôssemos sociáveis? o que seria de tudo se todo ser humano presente neste momento no planeta começasse a se perguntar essas coisas? haveria revolução? haveria qualquer tipo de comoção social? haveria passeatas ou coisas similares? que parte você teria nisso?

o que seria de você se colocasse um ponto final nessa vida virtual que você chama de própria? o que seria de você se você abrisse os olhos e encarasse a realidade sem maquiagem alguma? você se deprimiria? você se sentiria liberto? você pararia de tentar? você tentaria alguma coisa? você usaria alguma máscara e continuaria seguindo as regras? você seria o que você quisesse? ou será que seria o que gostariam que você fosse?

o que te faz continuar vivendo, um dia após o outro, na mesma realidade que você sempre teve?

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