7.12.08

não leia se estiver comendo

comia. comia vorazmente. comia mais que um faminto à frente de um prato de comida. era gorda. imensamente gorda. mais gorda do que você imaginou. além de tudo isso, era uma pessoa atordoada. não tinha amigos, colegas ou qualquer tipo de relacionamento afetivo com qualquer ser vivo. as pessoas que trabalhavam com ela tinham um certo asco por sua imagem, tamanho e postura. ela era o tipo de pessoa que não conseguia alcançar seus próprios pés.

não que ela fosse uma sociopata ou coisa assim, mas desde sempre teve dificuldades em lidar com outros seres que não ela. nunca, nem jamais se tocou. nunca se masturbou, tampouco teve um orgasmo. seu único prazer era comer, ensandecidamente. ao contrário do que possa pensar, ela não era frustrada, nunca teve plano algum sobre sua vida, nem nunca quis mudá-la. jamais pensou na possibilidade de mudança. sozinha, se uma palavra pudesse defini-la, essa era a palavra certa. vivia bem, para seus padrões. o dinheiro que conseguia era o suficiente para pagar todas suas despesas - que, em sua maioria, era comida.

um dia, entretanto, ela se cansou. se cansou da vida que levava, se cansou do trabalho que tinha, se cansou de não alcançar seus pés e se cansou de ler revistas femininas que falavam sobre a melhor posição para excitar seu parceiro. se cansou, mas não se deprimiu ou qualquer outro status desses distúrbios psicológicos. mas queria se vingar, queria ser notada por alguma coisa, queria chocar. porém, tudo que ela sabia fazer era seu trabalho mecânico e comer. o trabalho não poderia ajudá-la em muita coisa para chocar o mundo. só lhe restava comer. passou alguns meses pensando sobre o que poderia fazer para conseguí-lo. até que teve uma idéia. uma idéia genial, ela pensou. uma idéia que mudaria a sociedade.

planejou e colocou a idéia em ação, no horário de almoço de uma quarta feira. estava em um shopping bem localizado e bem freqüentado. com uma praça de alimentação enorme. foi a todos os restaurantes e pediu o maior item do menu. na hora do pagamento, pedia a todos que levassem o pedido até sua mesa. mesa, esta, que acabou virando uma fileira de mesas com pratos e mais pratos enormes. e ela comeu. comeu muito. comeu muito mais do que já comera no horário de almoço. depois que já estava completamente cheia, comeu mais. muito mais, mais do que o equivalente a uma semana de almoços.

as pessoas que presenciaram a cena - que não eram poucas, por sinal - ficaram cada vez mais enojadas de presenciarem a cena. mas, como seres humanos naturais, esperaram até saber o desfecho.

até que ela regurgitou. regurgitou em cima de uma bandeja que estava a sua frente. jogou a bandeja para o lado e continuou comendo o conteúdo da bandeja que seguia. quando estava quase terminando o prato, regurgitou de novo, mas dessa vez, ela se virou para que não caísse na comida. ao fazer isso, seu corpanzil deu um jeito de quebrar a cadeira e ela caiu no chão. ficou estatelada, de costas para o chão, com as pernas gordas presas ao que restou da cadeira um tanto levantadas. e vomitou. vomitou muito. alguém comentou depois do fato que ela parecia uma fonte de vômito.

daí para frente foi efeito dominó. as madames que tomavam seus cafés argelianos absurdamente caros começaram a vomitar. as crianças que se lambuzavam com sorvete começaram a vomitar. os executivos ocupados que não paravam de trabalhar nem na hora do almoço começaram a vomitar sobre seus papéis. os funcionários do estabelecimento começaram a vomitar sobre tudo e todos. quase se formou um rio de comida semi digerida boiando em líquidos mal cheirosos que saiam dos estômagos das pessoas. chamaram a polícia e o corpo de bombeiros. que, quando chegaram, vomitaram também.

depois de algumas horas e muito trabalho, todas as pessoas presentes foram atendidas. a essa altura, já havia câmeras e muitos repórteres esperando na porta do shopping. uma equipe conseguiu furar o bloqueio policial e transmitiu, ao vivo, a situação de calamidade encontrada no lugar. os telespectadores desavisados vomitaram também em suas casas. virou assunto público. daqueles que são explorados incessantemente em programas vespertinos de televisão. virou assunto tão público que foi digno de nota nos maiores jornais impressos e televisivos do país.

quanto à causadora de tanto caos não restou muita coisa. por conta de sua posição ao cair com a cadeira quebrada, se asfixiou e morreu afogada em seu próprio vômito.

e ela conseguiu o que queria.

5 comentários:

Layana Lossë disse...

uoooouuu! que mega nojento, Jo!
Adorei! Você escreve muuuuito bem!
Sobre aquele lance de sensações físicas ao ler um texto, esse me provocou enjôo.
:)

Anônimo disse...

Caramba! Tu misturou a cena do restaurante de Monty Phyton - O Sentido da Vida com a cena da montanha russa de Conta Comigo com a velocidade que só a mídia pode proporcionar. Parabéns, bela equação!

Anônimo disse...

Falando em nojo, tu leu o Guts, no meu blog?

Sabrine disse...

MELHOR CONTO!!!
UASHSUAHSAUHSASUHAUSH!!

MEU, NEM SENTI 'NOJINHO'...
MTO BOM CARA!!
AMEI!!

Anônimo disse...

Obrigado por Blog intiresny