3.8.11

o sonho

"às vezes queria sair da realidade...", ela me disse em uma das vezes que conversamos. já tinha parado com as anfetaminas, davam energia e um baratinho gostoso, segundo ela. tinha uma vida difícil, mas com muito luxo. podia dar presentes pra mãe, comprar roupas para as irmãs e deu uma casa de presente para família que ainda morava no mato grosso.

veio para a cidade grande quando tinha por volta dos dezoito, cheia de planos e sonhos. ela nunca me contou como começou, mas eu suponho que ela precisava de dinheiro rápido e farto. já que não tinha contatos para traficar drogas, escolheu a outra opção plausível. quando a conheci, ela já era "velha de guerra" como dizem por aí. tinha resenhas e fotos promocionais pelas áreas heterossexuais masculinas, e eram resenhas boas, devo dizer.

atendeu aos mais diversos tipos de gente, tenho certeza apesar de ela nunca ter me contado com qualquer detalhe os pormenores da profissão. quando se conversava com ela, qualquer pessoa jamais diria que ela fazia o que fazia, se portava como uma criança pedindo um doce. às vezes comentava que ainda tinha que ir ao "cabaré", mas não passava disso.

não cansava de me contar que estava cansada da vida que vivia, que precisava mudar de vida, mudar de ramo, mudar de estado, mudar de profissão. ouvi reclamar disso por uns três meses, se tudo isso. então passei a notar pequenas mudanças no seu cotidiano.

ela costumava dormir pelas manhãs, ir para academia à tarde e trabalhar desde o começo da noite até o último cliente. então ela passou a acordar cedo pelas manhãs, fazer cursos, ir para academia à tarde e continuar com o trabalho à noite. fez isso por alguns meses. sempre pensando que o esforço valeria à pena, que ela mudaria completamente.

um dia, conversando, me disse que tinha achado sua vocação. comissária de bordo. contou que estava em um ônibus que passava perto do aeroporto e viu uma comissária pronta para embarcar. de uniforme, maquiagem feita, unhas perfeitamente polidas e a malinha que é padrão. acho que ela vislumbrou na comissária tudo que ela queria ser e fazer para ganhar a vida. a comissária viajaria o mundo, era impecavelmente linda, tinha algum status, tudo o que alguém que uma mulher um pouco desesperada precisa para tomar como exemplo e fazer algo por si própria.

na última vez que falei com ela, tinha terminado o curso de comissária. queria saber o que aconteceu, mas tendo em vista que nunca mais a vi, talvez ela tenha conseguido viver viajando. talvez a realidade esperada fosse condizente com a realidade vivida. talvez o avião tenha caído. mas, provavelmente, ela só mudou de cabaré.

12.7.11

seu babaca

"nossa! Como você conseguiu essa cicatriz?"

"foi um acidente."

"até parece... acidente, ela com essa forma certinha. vai conta aí, é ritual de magia negra?"

"sério, foi acidente."

"nem foi! fala a verdade, você é darque, não é?"

"não, foi acidente de verdade."

"tá bom, finge que eu acredito. conta a verdade aí."

"você quer a verdade? então tá.

um dia eu tava voltando pra casa do colégio quando um cara num carro me parou pra perguntar o caminho. aí, depois que eu expliquei, ele sacou uma arma e me mandou entrar. eu falei que não tinha dinheiro, que era pobre e tudo mais, mas ele me falou que não era dinheiro o que ele queria. ele me vendou, me fez deitar no chão na parte de trás do carro e, sei lá, parece que demorou muito. o carro parou. ele me tirou do carro, ainda vendada, e me levou pra dentro de um lugar. quando ele tirou minha venda eu estava num quarto de luz amarela, bem porco e bem podre. tinha umas marcas na parede e tudo mais, bem filme de terror. eu fiquei com muito medo. aí, ele tirou a roupa dele e me amarrou num gancho que tinha na parede. foi horrível. tão horrível que eu desmaiei. Quando eu acordei ele ainda estava em cina de mim. eu comecei a gritar, mas eu acho que ninguém ouviu, acho que era por causa da mordaça que ele tinha posto, não sei, não lembro direito. aí ele pegou um ferro quente e começou a me ameaçar. não sei por que aquele cara fez isso, já que ele nem me queimou, acho que era só pra manter o terror. daí ele foi embora e me deixou lá no escuro. ele me ameaçou com facas, vidros, ferro, fogo, tudo que você conseguir imaginar. ele me dizia constantemente que se eu tentasse fugir seria pior. ele fez essa cicatriz aqui pra me lembrar disso. no dia que ele fez isso, o terceiro, eu desmaiei, e, sei lá acho que o cara era burro, porque ele me amarrou, mas esqueceu de tirar a faca do quarto. quando eu acordei, não tinha ninguém lá, eu estava sangrando, mas não esperei ninguém me ajudar. desloquei o ombro esquerdo pra conseguir pegar a faca e esperar por ele com ela escondida. quando ele voltou, eu fingi que estava dormindo e peguei a faca com a minha mão livre e cortei a garganta dele. matei ele. minha sorte foi que ele caiu perto de mim e ele estava com a chave do cadeado que estava prendendo a corrente e com um celular, senão ia ficar lá pra sempre. liguei pra polícia. depois de umas duas horas eles chegaram e me resgataram."

"Nossa, sério isso? desculpa te lembrar dessa atrocidade."

"tudo bem, não tava falando sério mesmo. seu babaca."

22.5.11

f5

eu ia escrever, mas preferi ficar fechada no meu mundinho.

lembrete: puta.

21.4.11

visão sobre professores

eu sou inteligente. pelo menos é o que dizem. nunca reparei que era inteligente até começar a ensinar os outros. ou eu sou muito acima da média (o que eu duvido incrivelmente), ou as pessoas as quais eu ensino são absurdamente burras. não todas, lógico, mas uns 80% vai fácil pra lista de gente ts (try spanish).

mesmo quando as pessoas ts não entendem algo eu tendencio a me culpar. eu realmente acredito que quando alguém não consegue aprender parte da culpa vem do mestre. a porcentagem de culpa, obviamente, varia de caso para caso, mas mesmo assim todas as variantes são influenciáveis pelo mestre, que, se fizer seu trabalho direito (vulgo: ter ferramentas, estar motivado e todos aqueles mimimis corporativos que me enchem o saco) culmina na equação de: mestre.(aluno.x²+y) = aprendizado. não importa o que o x ou o y representem, o mestre tem sempre algum tipo de poder sobre as variáveis. menos quando o bonitinho decide que vai morrer, mas aí já é outra história.

uma coisa que nunca consegui entender na minha já-não-tão-curta-assim carreira é professor que não encara o trabalho a sério. quando alguém se propõe a ensinar, na minha humilde e parca opinião, deve estar realmente disposta a tal. é trabalhoso, é cansativo, é irritante às vezes, mas é de extrema importância que seja feito com a atenção e paciência necessária. o fruto do seu trabalho aparece na sua frente antes de aparecer no bolso do seu chefe. e essa é uma das poucas profissões em que isso é possível. antes de pensar se você está puto, antes de pensar se o aluno é uma anta, antes de pensar se seu patrão te explora - não gosta, vai pra cuba. tenta espanhol. -, um professor deve pensar em como fazer aquele grupo ou aquela pessoa entender o que você deve passar. o que complica é que as pessoas adquirem informação por meios diferentes. e cabe ao professor conseguir perceber a necessidade de cada aluno ou grupo e criar uma espécie de elo emocional para que o aprendizado seja mais proveitoso e menos estressante.

por elo emocional eu digo entender a realidade do seu aluno, tentar descobrir traços da personalidade, coisas cotidianas e essa parafernalha toda que um bom observador consegue em vinte minutos de conversa livre. eu realmente acho que um professor nunca deve expor seu lado pessoal aos alunos, o lado pessoal do professor pode ser discrepante com o credo, a opinião e a vontade do aluno. quando isso acontece, dá merda. o aluno não aprende mais, porque ele não gosta de você como pessoa, sem influência nenhuma da sua didática, do método que você utiliza, do seu qi ou da sua capacidade acadêmica. eu minto para meus alunos. eu não exponho minhas opiniões a não ser que a do aluno ou do grupo sejam compatíveis. meu aluno não tem interesse em saber como está a minha vida, meu aluno não tem interesse em saber quem eu sou. meu aluno tem o único interesse em aprender, segundo meu ponto de vista - que vem funcionado.

aí a galera vem falar "mas os alunos não estão interessados!", faz os babacas se interessarem então, oras! tudo bem que a minha realidade como professora é BEM diferente da realidade dos professores de escolas regulares, mas, porra, se o professor é professor de verdade ele consegue fazer com que os mais maloqueiros dumau se interessem pelo assunto. o seu aluno está cagando se você fez faculdade para ir para a carreira acâdemica (que é uma piada) no brasil e acabou virando professor da rede pública. isso é azar seu. isso foi escolha sua, ninguém, além de você, tem que se sentir miserável por causa disso.

pra quem dá aula, qualquer tipo de aula, qualquer tipo de matéria, qualquer tipo de qualquer tipo: para de dar aula e vira mestre. para de dar aulinha e ministre aulas. para de dar aula e vire um professor de verdade.

p.s. eu nunca entendi quem me pergunta "ow, você ainda dá aula de inglês?" e eu lá pergunto "ow, você ainda é advogado?", "ow, você ainda é vendedor?"? caralho, professor não é atendente de telemarketing - ou pelo menos não deveria ser.

p.p.s. eu seria uma coordenadora pedagógica odiada pelo corpo docente, fato.

f5

na boa, tô me forçando a escrever esse punhado de letras. como fazer quando se tem ideias mas a preguiça ganha da vontade de escrever? tô muito relapsa, preciso escrever algum continho qualquer. nem que seja ruim. nem que seja tosco. nem que seja babaca. nem que seja como todos os outros. só pegar e escrever.


me dá um tema? obrigada.

31.3.11

boate versus boate itinerante

não há muita diferença entre o transporte público paulistano e as casas noturnas, boates, baladas, ou seja lá qual nome que você dá. é lógico que um dos dois sai ganhando, com bebidas, gente interessante se encostando, um suorzinho que libera alguns ferormônios e vira aquela loucura. também tem a música. sentir os graves fazendo seu corpo tremer e dar aquela sensação de prazer que é difícil de conseguir em outros lugares. vejamos, então.

você vai à boate está cheia. cheia como um ônibus às sete da manhã. a música toca alta e você não decide o que vai ouvir, algum dj o faz. assim como nas boates itinerantes que atendem a periferia, desde o advento dos celulares com alto falantes temos alguns djs em cada coletivo dessa cidade, e não, você também não decide o que vai ouvir, é o dj da periferia em ação. no entanto, os graves dos celulares não são potentes para fazer o corpo tremer, mas, em contrapartida, existem os buracos e os trilhos. treme. treme muito. treme mais do que a boate no ápice.

não importa a boate que você frequente, sempre, invariavelmente estará quente. assim como não importam as condições climáticas, nos coletivos sempre, invariavelmente estará quente. mas aí tem as bebidas, sempre um balcão chamativo com umas luzes bonitas e muitas garrafas nas estantes atrás dos bartenders. e a luta colossal para conseguir ser atendido e pedir uma garrafa de água que custa cerca de cinco reais ou uma lata de cerveja por uns seis reais e fora isso o preço só sobe. no coletivo o tiozinho te vende a mesma água por cerca de um e cinquenta e ainda te serve no lugar, com um sorrisão sincero no rosto. não há luta, não há ninguém praticamente implorando para ser servido. tem variedade também, sorvete, cerveja, iogurte, salgadinho, bala, chiclete, chocolate na promoção, três por um real.

convenhamos, os dois lugares sempre estão cheios. sempre tem gente suada se roçando, e também tem os flertes e a azaração marota entre pessoas. além das filas para entrar e o tempo absurdo para conseguir fazê-lo. não pode-se esquecer da entrada, as itinerantes tem preços mais populares a cerca de três reais - e você ainda pode descer e entrar em outra boate vip, sem pagar nada. as fixas oferecem o mínimo a cerca de vinte reais e tem a filosofia do "saiu, se fodeu, paga de novo pra entrar em outra". e depois do advento da lei antifumo em são paulo a pouca diferença diminuiu ainda mais. nos dois lugares você não sai com cheiro de fumaça e os pobres fumantes tem que sair para fumar, tanto em um como no outro. tirando a leve disparidade de que quando entrar em uma boate regular você sairá exatamente no mesmo lugar que entrou, na boate popular você sai em um outro lugar, outro bairro, outro mundo.

no fim: música que você não escolhe, gente se roçando, azaração, suor. ônibus ou boate, tanto faz.